Não raramente ouvimos críticos da fé cristã alegando que os cristãos do início da Era Cristã desrespeitavam profundamente as autoridades políticas e religiosas do Império Romano e que, por isso, foram severamente perseguidos. O breve estudo que segue pretende esclarecer algo sobre esse assunto - tire as suas próprias conclusões.
É claro que o cristão não podia, como legionário, se curvar perante Mitra, também não lhe convinha mostrar-se nu em jogos, tampouco lhe era permitido ter o Imperador como uma divindade. Assim como os judeus, os cristãos não tinham permissão moral e religiosa para certas práticas comuns aos romanos e é lógico que isso irou muitos líderes e dividiu famílias, promovendo incontáveis perseguições locais e imperiais contra os seguidores de Cristo. Devemos, ainda, considerar o ódio de Roma para com a Palestina e os judeus: aquele fim de mundo vivia no limite, sempre pronto para explodir. Os judeus não suportavam mais o seu status de povo dominado, indo desde os tempos dos Assírios e Babilônicos até o Império Romano, com alguns períodos curtos de liberdade. As promessas messiânicas de liberdade política enchiam os judeus de esperança e coragem - violentas revoltas se alastraram no território de Israel ao longo das décadas de antes de depois de Cristo. As particularidades judaicas, a sua resistência ao domínio romano e às cobranças de impostos, o seu desprezo pela cultura, religião e política romanas e a sua insistência em se rebelar, criaram em Roma o desejo oculto de mandar toda a Jerusalém pelos ares e acabar de uma vez por todas com aquele povo impertinente - foi exatamente o que fizeram na destruição total de Jerusalém em 70 d.C. Para os romanos, além do anseio pela destruição definitiva de Israel e dos judeus, havia o desprezo pela cultura e pelo povo em si: o que aqueles semitas peludos e brutos tinham a oferecer aos latinos, filhos de Heitor e Enéas? A ira romana contra os judeus, por fim, se refletiu no cristianismo, uma vez que, de início, os cristãos foram considerados apenas uma seita judaica - e seu líder apenas mais um desconhecido "semita peludo" e inculto, do Fim do Mundo, do desprezível Mar da Galileia, apinhado de camponeses ignorantes. A expansão da fé cristã, portanto, foi tida inicialmente como uma afronta judaica que precisava, urgentemente, ser retida - até porque, os primeiros convertidos eram principalmente judeus da diáspora. Como será que os cristãos, de modo geral, reagiram às preconcepções dos romanos para com eles?
O livro Império Romano, Patrick Le Roux, L&PMPOCKET, 2009, pgs 113-119, pode nos auxiliar nessa busca, primeiramente dando ênfase ao caso dos judeus e, em seguida, que no que me basearei agora, citando a questão dos cristãos: "Eles [os cristãos] se tornavam objetos de violências esporádicas e de denúncias caluniosas. A maioria deles não era nem provocadora, nem revoltosa. Todas as categorias sociais estavam representadas entre os cristãos primitivos. (...) Longe de ser uma atitude generalizada, apenas os mais extremistas eram tentados pela busca do martírio. (...) O medo da punição levava grande número de cristãos a respeitar a religião oficial, na qual o culto ao imperador era a forma mais difundida." Nos tempos de Constantino, quando o cristianismo foi oficializado, favorecer uma religião pequena, 10% dos habitantes romanos, foi tido como loucura - tudo indica que o Imperador, após a misteriosa vitória sobre Mexênico, entendeu que, de fato, o Deus Cristão existia e que, portanto, favorecê-lo lhe seria vantajoso. Segundo a especial da SuperInteressante, junho 2013, Ed. 319-A, pgs 59-61, com reforço no artigo A Igreja e o Conhecimento: a Antiguidade Preservada, o cristianismo foi aceito tanto pela fé de Constantino, quanto por seu potencial de preservar a cultura romana - o que fez com excelência.
Natanael Pedro Castoldi
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Obrigado pelo trabalho
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