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O Cânon do Novo Testamento foi Escolhido no Concílio Niceno?

-> Apresentação e Índice
Noutro dia, tomando para ler novamente uma antiga edição da Superinteressante, "Os Maiores Mistérios dos Livros Sagrados", Julho, 2008, Editora Abril, deparei-me, na página 37, com as seguintes declarações: "As igrejas maiores e mais influentes tentavam impor seus textos, o que as menores não aceitavam. (...) A peleja continuou até o século 4, quando tudo indicava que o cristianismo apostólico iria prevalecer sobre os outros cristianismos. (...) Foi quando o imperador de Roma, Constantino, entrou em cena e interveio no impasse. (...) Os cristãos deixaram de ser perseguidos em 313 e apenas 12 anos depois seus bispos foram convocados para o Concílio de Nicéia, primeiro passo dado para a criação do Novo Testamento. (...) os evangelhos de Marcos, Lucas, Mateus e João foram escolhidos (...) por uma razão muito simples: expressavam a visão dominante na Igreja. E todos os demais foram considerados apócrifos, falsos e perigosos para o estabelecimento do novo livro."

Não precisamos nos esforçar muito para perceber alguns dos vários erros históricos contidos nessas alegações da Super, mas, ainda assim, há muita gente que acredita nessa história e que tem tal revista como uma fonte de autoridade no assunto, por isso é importante trabalhamos a questão com alguma profundidade. Comecemos com algumas perguntas, que nortearão o estudo que segue:

- Existiam mesmo vários cristianismos no início da Era Cristã?
- Foi no Concílio de Nicéia que se iniciou a criação do Novo Testamento e a seleção do seu cânon?
- O motivo que determinou a escolha dos livros que hoje compõem o Novo Testamento estava em sua afinidade com a visão teológica dos bispos comandados por Constantino?
- O principal motivo para a rejeição de diversos livros foi o seu potencial de atrapalhar os negócios do imperador?

1 - Existiam mesmo vários cristianismos no início da Era Cristã?
Vamos às evidências arqueológicas: o que temos de mais antigo em termos de cristianismo é o cristianismo apostólico. A confecção dos apócrifos, que vieram a sustentar doutrinas heréticas, é posterior à conclusão do Novo Testamento e há uma porção considerável de livros neotestamentários mais antigos do que qualquer manuscrito ou artefato que indique a existência de "outros cristianismos" - na verdade, as mais antigas referências ao principiar de movimentos heréticos estão no próprio Novo Testamento, como o proto-gnosticismo que aparece na Primeira Epístola de João e o cristianismo judaizante que aparece em Atos e nalgumas epístolas paulinas. Mas nenhum deles precede o cristianismo apostólico. Como já é dito há um bom tempo: a Bíblia é a raiz de todas as heresias, e não o contrário.

Vamos aos fatos: 
- Há quatro fragmentos do evangelho de Marcos que datam, no máximo, da década de 50 d.C., contendo os trechos: 4:28, 6:48, 6:52-53 e 12:17. Há também um fragmento de Atos (27:38) datado da década de 60 d.C.; um de Romanos (5:11-12) da década de 70 d.C.; um de 1 Timóteo (3:16; 4:1-3), da década de 70 d.C.; um de 2 Pedro (1:15) da década de 70 d.C.; e um de Tiago (1:23-24), também da década de 70 d.C. Todos esses fragmentos de manuscrito foram encontrados nas cavernas de Qumran, nas proximidades do Mar Morto, obstruídas e abandonadas na década de 70 d.C.
Fonte: Por Que Confiar na Bíblia?, Amy Orr-Ewing, Ultimato, 2008, pg 49.
- Há um manuscrito do Evangelho de João (18:31-33 e 37 e 38), o Papiro John Rylands, datado do ano 125 d.C. Considerando que o Evangelho de João foi escrito em Éfeso e que tal manuscrito foi desvendado no Egito, devemos esperar, pelo menos, uns vinte anos entre a confecção do original e o espalhar de cópias até terras tão distantes, indicando que esse documento pode ter sido redigido partindo do próprio autógrafo de João. Há ainda outros papiros de grande antiguidade: o Papiro Chester Beatty I, contendo 30 folhas (originalmente 220) e abrangendo partes de Mateus, Marcos, Lucas, João e Atos, é datado do início do século III; o Papiro Chester Beatty II, contendo 86 folhas (originalmente 104), abrangendo partes de Romanos, Hebreus, 1 e 2 Coríntios, Efésios, Gálatas, Filipenses, Colossenses e 1 e 2 Tessalonicenses, é datado do final do século II ou início do século III; o Papiro Bodmer II abrange todo o Evangelho de João, especialmente os capítulos 1 a 14, que ocupam 104 folhas, com fragmentos dos capítulos 15 a 21 em outras 46, e é datado do final do século II ou do início do século III.
Fonte: Crítica Textual do Novo Testamento, Wilson Paroschi, Vida Nova, 2008, pgs 44-46.
- Segundo Amy Orr-Ewing, com os manuscritos datados de 180-225 d.C., como o Papiro Chester Beatty e o Papiro Bodmer II, XIV e XV, é possível reconstruir de forma completa os Evangelhos de Lucas e João, os livros de Romanos, 1 e 2 Coríntios, Gálatas, Efésios, Filipenses, Colossenses, 1 e 2 Tessalonicenses, Hebreus, parte dos Evangelhos de Mateus e Marcos e parte dos livros de Atos e Apocalipse.
Fonte: Por Que Confiar na Bíblia?, Amy Orr-Ewing, Ultimato, 2008, pg 44.
- Temos algo entre 10 e 15 manuscritos neotestamentários que foram escritos nos primeiros cem anos após a conclusão do Novo Testamento, abrangendo grandes trechos dos Evangelhos e das cartas de Paulo. Em dois séculos, o número aumenta para cerca de quarenta ou mais manuscritos. Até antes do ano 400 d.C., temos em mãos 99 manuscritos neotestamentários, incluindo o Novo Testamento completo encontrado no Códice Sinaítico. Há algo entre 20 e 25 mil manuscritos antigos do Novo Testamento e cerca de um milhão de citações do Novo Testamento da parte dos Pais da Igreja - só com elas é possível reconstruir todo o texto neotestamentário.
Fonte: Origem, Confiabilidade e Significado da Bíblia, organizado por Wayne Grudem, C. John Collins e Thomas R. Schreiner, Vida Nova, 2013, Capítulo 12 por Daniel B. Wallace, pg 113.
- O manuscrito antigo mais importante do Novo Testamento é datado de 300 anos após o texto original, mas há dois papiros importantes que estão 100 anos perto do autógrafo. Segundo John Blanchard, o Papiro John Rylands pode ser datado entre 117 e 138 d.C. Além disso, há três fragmentos de papiro guardados em Oxford que foram datados como sendo do terceiro quarto do primeiro século.
Fonte: Por que Acreditar na Bíblia?, John Blanchard, Fiel, 2006, pg 9.
- A epístola de Clemente aos coríntios (95 d.C.) cita os Evangelhos, Atos, Romanos, 1 Coríntios, Efésios, Tito, Hebreus e 1 Pedro; as cartas de Inácio (115 d.C.) citam Mateus, João, Romanos, 1 e 2 Coríntios, Gálatas, Efésios, Filipenses, 1 e 2 Timóteo e Tito.
Fonte: Por Que Confiar na Bíblia?, Amy Orr-Ewing, Ultimato, 2008, pg 45.
- As epístolas de Clemente, Inácio e Policarpo, datadas de 95 a 110 (ou 115) d.C., citam 25 dos 27 livros do Novo Testamento. Somente Judas e 2 João não foram citados, mas já haviam sido escritas, pois Judas era familiar de Jesus e 3 João foi escrita depois de 2 João.
Fonte: Não Tenho Fé Suficiente Para Ser Ateus, Norman Geisler e Frank Turek, Vida, 2012, pg 241.
- Existem cerca de 75 fragmentos de papiro datados desde 135 d.C. até o século VIII, contendo partes de 25 dos 27 livros do novo Testamento, totalizando 40% do texto.
Fonte: A Bíblia de Estudo Anotada Expandida, Mundo Cristão, 2007, pg 1302.

Somente com as epístolas paulinas, escritas até pouco depois da segunda metade da década de 60 d.C., é possível fundamentar toda a teologia cristã ortodoxa, incluindo a divindade de Cristo e a existência da Trindade. As interpretações heréticas vieram desses textos originais. Leia mais sobre o assunto: A Magnífica História da Vida e da Obra de PauloOs Mais Antigos Testemunhos do Novo TestamentoAs Fontes Documentais do Novo Testamento.

A datação dos apócrifos:
- O Evangelho de Maria Madalena: século II d.C..
- O Evangelho de Pedro: século II d.C.
- O Evangelho dos egípcios: segunda metade do século II d.C.
- O Evangelho de Filipe: a partir de 120 d.C.
- O Evangelho de Bartolomeu: entre os séculos II e III d.C.
- O Evangelho de Tomé, o Dídimo: século III d.C.
Fonte: Bíblia Apologética com Apócrifos, ICP, 2014, pgs 860-862.

Com base nas evidências até aqui levantadas, podemos constatar que os documentos canônicos do Novo Testamento, em sua grande maioria, encontram respaldo arqueológico para sua proeminência por sobre os apócrifos, indicando constituírem a primeira percepção completa do cristianismo. É claro que interpretações errôneas de alguns aspectos da fé cristã podem ter surgido ainda no período apostólico, mas não podemos dizer que já existiam "diferentes cristianismos" nesse período, cosmovisões cristãs singulares e coesas para além da principal. Além disso, tais interpretações se limitavam a indivíduos e pequenos grupos, geralmente se isolando em comunidades específicas, o que destoa totalmente da visão genuína da fé cristã, extraída diretamente das obras apostólicas, que era crida pela grande maioria dos cristãos de todas as regiões onde havia presença cristã. E isso não foi imposição dos apóstolos, de forma alguma: a Igreja, no início da Era Cristã, não tinha força política, econômica e numérica para impor qualquer coisa, tanto que, num primeiro momento, não conseguiu impedir que grupos minoritários disseminassem heresias. Se havia a proeminência de uma visão cristã, a mais antiga, é porque a maioria dos cristãos concordava livre e sinceramente com a autoridade e o testemunho dos apóstolos e porque muitos dos primeiros missionários cristãos foram testemunhas oculares do ministério de Cristo, sabendo com clareza aquilo que Jesus realmente disse e quem Ele foi.

Repare que os fragmentos mais antigos que temos, de Marcos, João, Atos, Romanos e doutras epístolas de Paulo, de Pedro e de Tiago, além de outros autores neotestamentários, sustentam basicamente todo o Novo Testamento: em Marcos é possível encontrar o essencial sobre Cristo, incluindo alusões à Sua divindade, assim como nas obras de Paulo, que concentram o fundamental da teologia cristã. Mas é no texto de João que encontramos aquilo que de mais profundo há em termos de cristologia, com indicações diretas da eternidade e da divindade de Cristo. Também é interessante notar que há uma comunicação entre os autores de alguns desses documentos, como ocorre quando Pedro considera os escritos paulinos como "escritura", ou seja, como "divinamente inspirados" (2 Pedro 3:16). Além disso, há evidências claríssimas de que Mateus e Lucas utilizaram Marcos como base para a confecção de seus evangelhos, o que evidencia uma concordância de testemunho entre os evangelistas mais antigos, destoando daquilo que aparece nos apócrifos, posteriores e mais míticos. Há uma inquestionável unanimidade de pensamento entre - e exclusivamente - os documentos neotestamentários tidos como canônicos.

Ao ler o artigo "Uma Análise das Evidências Extra-Bíblicas sobre Jesus", perceba como os testemunhos pagãos e judaicos acerca de Cristo geralmente apontam para aspectos da visão ortodoxa acerca de Cristo, como, por exemplo, a Sua vinda em carne e a Sua morte na Cruz, a Sua ressurreição dos mortos, a Sua sabedoria, o fato de realizar sinais e milagres e o fato de Seus discípulos o considerarem salvador e Deus. Esses antiquíssimos testemunhos nos ajudam a interceptar a visão mais antiga e disseminada de cristianismo no início da Era Cristã, de modo a ser a mais bem, ou talvez a única, conhecida pelos não cristãos. Esses relatos não concordam com as perspectivas heréticas que ganharam força do século II em diante.

2 - Foi no Concílio de Nicéia que se iniciou a criação do Novo Testamento e a seleção do seu cânon?
Depois de trabalhado o assunto do tópico anterior, a resposta para essa pergunta é óbvia. É claro que o Novo Testamento já estava devidamente estabelecido e consolidado antes do Concílio Niceno, havendo evidente e especial interesse da parte dos cristãos para com os livros considerados canônicos. É interessante perceber que NÃO FOI no Concílio Niceno que a configuração atual do cânon neotestamentário começou a ser cogitada, segundo os interesses de Constantino - esse era um debate de séculos, dos tempos nos quais a Igreja não tinha poder político e numérico para impor qualquer coisa tanto a hereges quanto a pagãos.

A verdade é que não foi nem no Concílio Niceno que os 27 livros do cânon Novo Testamento foram oficializados, mas no Concílio de Cartago, em 397 d.C., sem a tutela de Constantino. Só que isso não significa que já não havia uma discussão anterior sobre o assunto. A diferença é que nos primeiros concílios a Igreja não estava mais sendo perseguida, podendo reunir-se com tempo e em grupos numerosos de discussão, além disso, nesses concílios o que se fez foi apenas oficializar o conjunto dos livros neotestamentários, não significando que esses livros não tenham sido reconhecidos como canônicos separadamente antes desses grandes encontros (2 Pe 3:16; 1 Tm 5:18). O fato é que a maioria dos livros do Novo Testamento foi aceita como canônica no século posterior ao dos apóstolos - houve alguma controvérsia quanto aos livros Hebreus, Tiago, 2 Pedro, 2 e 3 João e Judas. A seleção do cânon foi um processo que continuou por séculos até que cada livro provasse seu valor, concordando com os critérios de autenticidade, que são:

- Se o livro foi escrito ou influenciado por algum apóstolo.
- Se o livro desse uma prova intrínseca de seu caráter peculiar, inspirado e aprovado por Deus. O material deveria apresentar algo diferente de qualquer outro livro ao transmitir a revelação de Deus.
- O consenso entre as igrejas. O livro deveria ser reconhecido e utilizado pela grande maioria das igrejas cristãs - e, de fato, houve grande consenso entre as primeiras igrejas sobre quais livros mereciam um lugar no cânon. Nenhum livro cuja autenticidade foi questionada por um número expressivo de igrejas entrou no cânon.
Fonte: A Bíblia de Estudo Anotada Expandida, Mundo Cristão, 2007, pg 1301.

Um resumo do debate sobre o cânon neotestamentário:
Não há uma forma simples de explicar a formação do cânon neotestamentário. Mesmo que as heresias tenham levado os cristãos a selecionar os livros canônicos, elas não foram a única força motivadora. Mediante a perseguição, os cristãos tinham a necessidade de saber por quais livros estariam morrendo, quais deveriam ser postos à disposição das autoridades imperiais e, além disso, era da maior importância definir com clareza quais documentos poderiam ser usados nas igrejas e para a edificação pessoal - esse desejo se intensificou quando os apóstolos começaram a morrer.
Fonte: Merece Confiança o Novo Testamento?, F. F. Bruce, Vida Nova, 2010, pg 36.

É fato que foram os líderes cristãos que oficializaram o cânon, mas não foram eles os maiores responsáveis pela resolução da questão. O que eles fizeram foi apenas oficializar uma decisão que a Igreja já havia tomado de forma gradual. Esse processo de escolha começou com a leitura de litúrgica de textos de pessoas próximas a Jesus - os apóstolos e os discípulos dos apóstolos -, ao lado da proclamação das Escrituras judaicas. Os escritos mais respeitados, que se alinhavam aos ensinamentos mais tradicionais da Igreja e que eram mais úteis para a igreja local, acabaram sendo os mais lidos - ou seja, as tradições herdadas ajudaram a selecionar os textos, não tendo sido os textos os responsáveis pelas primeiras tradições.

No início do terceiro século, Orígenes fez uma pesquisa entre as igrejas cristãs para saber quais livros elas estavam usando. Como resultado de seu trabalho, Orígenes formulou uma lista com três grupos de livros: os livros aceitos, os questionados e os não confiáveis. Os amplamente aceitos eram: os quatro Evangelhos, as 13 Cartas de Paulo, Atos, 1 Pedro, 1 João e Apocalipse; os questionados eram outros seis livros que completam o NT: Hebreus, Tiago, 2 Pedro, 2 e 3 João e Judas; aqueles que a maioria das igrejas tinha como não confiáveis eram: o Evangelho de Tomé, o Evangelho dos Egípcios e o Evangelho de Matias.
Fonte: A Bíblia e Sua História, Stephen M. Miller e Robert V. Huber, SBB, 2006, pg 94.

Segundo F. F. Bruce, "os livros do Novo Testamento não se tornaram escritos revestidos de autoridade para a Igreja porque foram formalmente incluídos em uma lista canônica; pelo contrário, a Igreja incluiu-os no cânon porque já os considerava divinamente inspirados, reconhecendo neles o valor inato e, em geral, a autoridade apostólica, direta ou indireta." Sobre os primeiros concílios canônicos, que se realizaram no Norte da África, em Hipona Régia (393 d.C.) e em Cartago (397 d.C.), Bruce afirma que eles "não objetivavam impor algo novo às comunidades cristãs, pelo contrário, o intuito era sistematizar o que já era uma prática comum."
Fonte: Merece Confiança o Novo Testamento?, F. F. Bruce, Vida Nova, 2010, pg 36.

- Clemente de Roma, 96 d.C.: demonstra conhecer Mateus, Romanos, 1 Coríntios e Hebreus.
- Inácio, de Antioquia (116 d.C.), Policarpo, de Esmirna (69-155 d.C.), e Papias, de Hierápolis (80-155 d.C.), atestaram Mateus, João, as epístolas paulinas, 1 Pedro, 1 João e Atos.
- O Didaquê, 120 d.C.: destaca Mateus e conhece a maioria dos livros do NT.
- Justino Mártir, 100-165 d.C.: atestou Apocalipse, Hebreus e Marcos.
- Marcião, 140 d.C.: o heresiarca em questão reconheceu Lucas e dez epístolas de Paulo.
- Hermas, 150 d.C.: autentica Mateus, Efésios, Apocalipse e, aparentemente, Hebreus e Tiago.
- Teófilo de Antioquia, 115-188 d.C.: adotou a maior parte dos livros do NT.
- Clemente de Alexandria, 155-215 d.C.: aceitou todos os livros do NT.
- Melito, de Sardes, 170 d.C.: citou trechos de todos os livros do NT, exceto Tiago, Judas e 2 e 3 João.
- Vulgata Latina, antes de 170 d.C.: atesta todos os livros do NT, menos Tiago e 2 Pedro. Hebreus foi acrescentada antes dos tempos de Tertuliano.
- O Fragmento Muratoriano, 172 d.C.: autentica os quatro Evangelhos, Atos, nove epístolas de Paulo às igrejas e quatro pessoais, as cartas de Judas, 1 e 2 Pedro e 1 e 2 João e Apocalipse. Acrescenta o Pastor de Hermas, mas observa que, embora seja um livro digno de ser lido nas igrejas, não possui a mesma autoridade que os canônicos.
- Irineu, 140-203 d.C.: o discípulo de Policarpo, que fora discípulo de João, reconheceu os quatro Evangelhos, Atos, Romanos, 1 e 2 Coríntios, Gálatas, Efésios, Filipenses, Colossenses, 1 e 2 Tessalonicenses, 1 e 2 Timóteo, Tito, 1 Pedro, 1 João e Apocalipse.
- Tertuliano, 150-222 d.C.: atesta os quatro Evangelhos, treze epístolas paulinas, Atos, 1 Pedro, 1 João, Judas e Apocalipse. Rejeitou Hebreus por acreditar que o autor era Barnabé.
- Orígenes de Alexandria, 185-253 d.C.: aceitou, inclusive, os livros que eram mais contestados, como Hebreus, 2 Pedro, 2 e 3 João, Tiago, Judas e Apocalipse.
- Cipriano, 200-258 d.C.: não atestou Hebreus e não citou Filemom, Tiago, 2 e 3 João e Judas.
- Dionísio de Alexandria, 200-265 d.C.: autenticou Hebreus e reconheceu Apocalipse, Tiago e 2 e 3 João.
- Papiros de Chester Beatty, século III: autenticam os quatro evangelhos, Atos, as epístolas paulinas, Hebreus e Apocalipse.
- Atanásio de Alexandria, 298-373 d.C.: considerou canônicos os 27 livros que hoje compõem o NT.
- Basílio da Capadócia, 329-378 d.C., e Gregório de Nazianzo, 330-390 d.C., reconhecerem todos os livros do NT, menos Apocalipse, mesmo tendo-o citado como obra de João.
- Jerônimo, 340-420 d.C.: atestou todos os livros do NT.
- João Crisóstomo, 347-407 d.C.: aceitou todos os livros do NT, menos 2 Pedro, 2 e 3 João e Apocalipse.
- Teodoro de Mopsuéstia, 350-428 d.C.: rejeitou as epístolas universais e Apocalipse, seguindo o Cânon de Constantinopla.
- Agostinho, 354-430 d.C.: aceitou todos os livros, inclusive os 7 que eram questionados.
- A Peshita, 411-435 d.C.: também seguiu o Cânon de Constantinopla.
- Os Concílios: a delimitação do cânon do NT não foi obra dos concílios, mas do valor intrínseco de cada livro. O Terceiro Concílio de Cartago, 397 d.C.: a primeira decisão oficial sobre o cânon, determinando que só os livros canônicos poderiam ser lidos nas igrejas - atestou os 27 do NT atual. O Concílio de Hipona (420 d.C.), confirmou o de Cartago. A seleção do cânon foi, portanto, um processo espontâneo que se desenrolou na Igreja ao longo dos séculos, até que cada livro fosse autenticado.

"O cânon do NT formou-se espontaneamente, e não pela ação dos concílios da igreja. A inspiração e a autoridade intrínseca foram os fatores determinantes em seu reconhecimento e efetiva canonização. Em 200 d.C., o NT já continha essencialmente os mesmos livros que temos hoje. (...) Antes do final do século III, praticamente todos os livros extracanônicos já haviam sido expurgados das listas autorizadas. (...) Durante o século IV, praticamente cessou no Ocidente o debate sobre as questões do status canônico de determinados livros, isso graças à influência de Jerônimo e de Agostinho."
Fonte: Manual Bíblico Unger, Merril Frederick Unger, Vida Nova, 2006, pgs 709-714.

3 - O motivo que determinou a escolha dos livros que hoje compõem o Novo Testamento estava em sua afinidade com a visão teológica dos bispos comandados por Constantino?
Como vimos, as motivações que levantaram o debate sobre os livros que deveriam ser incluídos no cânon foram a necessidade de saber quais documentos poderiam ser usados nas igrejas, qual material deveria ser apresentado às autoridades romanas, por quais livros os cristãos estavam morrendo e para combater as heresias, que vieram depois do cristianismo ortodoxo. A escolha desses livros precedeu o tempo de Constantino e foi concluída depois de sua morte. Os critérios de escolha não eram essencialmente as afinidades teológicas do material com o interesse dos bispos, pois muitos livros teologicamente viáveis, como o Pastor de Hermas, 1 e 2 Clemente, o Didaquê e a Epístola de Barnabé, e alguns politicamente interessantes, como Atos de Pilatos, que poderia angariar mais aceitação dos romanos, foram excluídos do cânon simplesmente por não concordarem com os critérios de autenticidade anteriormente trabalhados. A questão não era estritamente ideológica, mas centrava-se também em coerência histórica.

4 - O principal motivo para a rejeição de diversos livros foi o seu potencial de atrapalhar os negócios do imperador?
Conforme vimos, os livros que ficaram de fora do cânon passaram por um criterioso filtro e diversas obras com grande potencial de edificação, que concordavam com a teologia ortodoxa, também foram excluídas. Isso já é suficiente para evidenciar que os livros descartados do cânon não eram somente os "inconvenientes". A verdade é que, por ocasião do uso dos critérios de autenticação, até livros considerados inconvenientes por muitos séculos foram inclusos, como Hebreus e Tiago. A questão, portanto, não está em conveniência ou inconveniência, mas no resultado das observações, muitas delas imparciais, que cristãos de vários séculos fizeram acerca do material neotestamentário.

A verdade é que os livros excluídos por seu conteúdo eram tardios demais, não tinham autoria apostólica ou associação com algum apóstolo, não apresentavam coerência com os livros já considerados, não traziam aspectos teológicos significativos, nunca foram aceitos por uma parte significativa da Igreja e se mostravam como nada mais do que leituras piedosas e, muitas vezes, fictícias, cuja inautenticidade era facilmente reconhecida pela leitura do material e pela comparação com os livros mais prestigiados. Além disso, havia uma tradição muito mais forte, com muito mais evidências documentais, para os 27 livros que hoje compõem o NT.

O testemunho de Eusébio de Cesaréia, 263-340 d.C.:
"(...) entre os primeiros, deve ser colocada a santa tétrade dos Evangelhos; esses são seguidos pelo Livro de Atos dos Apóstolos; depois deste deve-se mencionar as epístolas de Paulo, as quais são seguidas pelas reconhecidas primeira Epístola de João, bem como a primeira de Pedro, a ser de igual modo aceita. Após esses, devem ser colocados (...) o Apocalipse de João (...). Esses, portanto, são reconhecidos como genuínos. Entre os livros questionados, (...) ainda que sejam aproveitados por muitos, são reputados aquele chamado Epístola de Tiago e de Judas. Também a Segunda Epístola de Pedro e os chamados a Segunda e a Terceira de João (...). Entre os espúrios devem ser alistados ambos os livros chamados Atos de Paulo e aquele chamado Pastor e o Apocalipse de Pedro. Além desses, os livros chamados a Epístola de Barnabé e as chamadas Instituições dos Apóstolos.
(...)
Assim, teremos condições de conhecer esses livros e os citados pelos hereges sob o nome dos apóstolos (...) o caráter e o estilo em si [dos apócrifos] é muito diferente do dos apóstolos, e os sentimentos, e o propósito dessas coisas que são neles apresentadas, desviando-se ao máximo da ortodoxia sadia, provam evidentemente seres ficções de homens heréticos".
Fonte: História Eclesiástica, Eusébio de Cesaréia, CPAD, 2000, pgs 103-104 (Livro 3, capítulo XXV).

Conclusão: tornou-se óbvio que o debate sobre o cânon do Novo Testamento existiu desde as primeiras décadas da Era Cristã e que não foi o Concílio de Nicéia que oficializou o cânon neotestamentário - foram outros, como o de Cartago. Na verdade, os próprios cristãos, natural e universalmente, é que reconheceram os 27 livros que constituem o NT atual, que os concílios apenas promulgaram. Vale notar que as maiores influências para a diminuição dos debates acerca dos documentos neotestamentários foram autoridades cristãs, como Jerônimo e Agostinho, e não imperadores como Constantino ou, mesmo, os concílios.

Não esqueça que livros que teriam sido muito úteis para a Igreja foram retirados do cânon, como o Pastor de Hermas, e que livros com potencial de gerar complicações foram incluídos, como Hebreus e Tiago.

A Superinteressante, definitivamente, foi infeliz em suas declarações.

Natanael Pedro Castoldi

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O Testemunho Ocular do Evangelho de João

Ler e escrever sobre apologética cristã é, verdadeiramente, gratificante. Enquanto a superfície do debate (leigo) religioso, filosófico e científico estremece com um turbilhão de acusações, pressuposições, ofensas e todo o tipo de alegação furada contra o cristianismo, prossigo tranquilo, encontrando as respostas de que preciso e solucionando os problemas a mim sugeridos. O fato é que, na tranquilidade, na paciência do pesquisador (é claro que com algum desprendimento financeiro para adquirir o material necessário), ainda não me deparei com nenhuma "incoerência da fé cristã" que não encontre a sua resposta naquilo que já foi pensado e publicado pela vastíssima multidão de intelectuais cristãos que trabalham na defesa da fé há dois milênios. A sensação que dá é a de que todo a guerra de ideias e ataques morais que se desenrola continuamente no mundo acadêmico e, principalmente, nos antros da internet, com relação ao cristianismo, parte do duvidoso para acabar em lugar nenhum - nada passa de uma grosseira perda de tempo, incoerente e vazia do início ao fim, totalmente baseada em distorções e mentiras.

De fato, toda a energia gasta nesse conflito superficial, movido pela vaidade, seria suficiente e melhor empregada num aprofundamento em pesquisa, na seleção honesta do material e na verificação dos argumentos e da resposta da oposição, isso através de uma calma, centrada e isenta análise dos fatos - aí sairíamos desse limbo criativo, finalmente abandonaríamos as acusações e respostas que são desferidas há milênios, e finalmente avançaríamos para níveis mais profundos de debate. Escrevo isso porque foi exatamente assim que me senti ao ler o livro "Não Tenho Fé Suficiente Para Ser Ateu", Norman Geisler e Frank Turek, Vida, 2012: "estou aqui, tranquilo diante de um bocado de respostas coerentes para as mais diversas alegações anticristãs, enquanto milhares de pessoas continuam desferindo os mesmos argumentos infundados e se digladiando em nome deles." Diversas partes do livro me fizeram abrir um sorriso involuntário, como resposta a uma reação de surpresa do tipo: "é tudo tão simples assim?! As respostas para a maioria dos problemas bíblicos estão mais acessíveis e são mais óbvias do que eu imaginava!" Uma dessas partes foi aquela que demonstrou, através do próprio texto de João, a quantidade de traços de um testemunho ocular presente nesse Evangelho, que seguidamente é considerado bastante tardio e fruto de um razoável desenvolvimento teológico - o material indica 59 evidências, dispostas entre as páginas 269 e 275. Não vou listar todas.

1 - A utilização dos jarros de água feitos de pedra, Jo 2:6, foi amplamente confirmada pela arqueologia.
2 - É pouco provável que o relato da transformação da água em vinho, o primeiro milagre de Jesus relatado, seja uma invenção, uma vez que a Igreja Primitiva tinha uma forte tendência ao ascetismo. Jo 2:8.
3 - A arqueologia confirmou o lugar correto do poço de Jacó. 4:6.
4 - Josefo (História da guerra judaica 2.232) confirma a existência de severa rivalidade entre os judeus e samaritanos do tempo de Cristo. 4:9.
5 - O termo "desce" descreve com precisão a topografia da Galiléia ocidental, já que existe uma queda considerável de Caná para Cafarnaum. 4:46, 49 e 51.
6 - O termo "subiu" é compatível com o aclive para Jerusalém. 5:1.
7 - A arqueologia confirmou a existência, a localização e a descrição de cinco entradas do tanque de Betesda (5:2). Escavações realizadas entre 1914 e 1938, mostraram que o relato de João sobre o tanque é perfeito - tendo sido destruído em 70 d.C., é improvável que qualquer registro que não fosse ocular apresentasse tal nível de detalhes. Quando João diz, sobre o Tanque, que ele "está" ou que ele "existe", coloca-se numa posição de testemunha de antes da sua destruição.
8 - O fato de as multidões desejarem fazer de Jesus um rei, reflete muito bem o fervor nacionalista da Israel do Século I. 6:15.
9 - Tempestades repentinas e severas são comuns no mar da Galiléia (6:18).
10 - É improvável que o autor tenha inventado o trecho no qual Cristo ordena que sua carne fosse comida e o seu sangue bebido (6:53). Apesar de ter um significado teológico claro, tal passagem causou grande desconforto.
11 - É igualmente improvável que a rejeição massiva de discípulos de Cristo em Jo 6:66 seja uma invenção.
12 - Também é improvável que a acusação de Jesus estar cheio de demônios seja uma invenção (7:20).
13 - O uso do termo "samaritano" como ofensa para Cristo demonstra o conhecimento do autor sobre a rivalidade entre judeus e samaritanos (8:48).
14 - É pouco provável que o desejo dos judeus "que haviam crido nele" de apedrejá-lo seja uma passagem fraudulenta (8:31, 59).
15 - A arqueologia confirma a existência e a localização do Tanque de Siloé (9:7).
16 - O fato de o homem curado chamar Jesus de "profeta", e não uma posição mais elevada, sugere que o incidente é uma história sem retoques (9:17).
17 - O Pórtico de Salomão, única área do Templo protegida do vento frio de inverno, que vinha do leste, para onde Jesus se encaminhou durante uma festa no inverno, é mencionado diversas vezes por Josefo (10:22-23).
18 - Três quilômetros (15 estádios), realmente é a distância entre Betânia e Jerusalém (11:18).
19 - Considerando a animosidade posterior entre judeus e cristãos, o fato de judeus terem confortado Marta e Maria dificilmente seria inventado (11:19).
20 - Os panos usados para sepultar Lázaro eram comuns em sepultamentos judaicos do Primeiro Século (11:44).
21 - A descrição da composição do Sinédrio no início do Primeiro Século é precisa (11:47).
23 - Josefo confirma que Caifás era o sumo sacerdote daquele ano (11:49).
24 - A limpeza cerimonial era comum na preparação da Páscoa (11:55).
25 - É improvável que o ato da Maria em secar os pé de Jesus com os cabelos seja uma invenção, uma vez que isso poderia facilmente ter sido visto como uma provocação sexual (12:3).
26 - A agitação de ramos de palmeira era um costume judaico comum para celebrar vitórias militares e recepcionar os governantes (12:13).
27 - É improvável que a frase "o Pai é maior do que eu" seja uma invenção, caso o autor de uma ficção desejasse produzir a divindade de Cristo (14:28).
28 - O uso da metáfora do nascimento de uma criança (16:21) é totalmente judaico - foi encontrado nos Manuscritos do Mar Morto (1QH 11:9-10).
29 - A postura padrão da oração judaica era "olhar para o céu" (17:1).
30 - É improvável que uma história inventada para sustentar a divindade de Jesus conteria uma passagem que afirma que as palavras de Cristo "vieram do Pai" (17:7-8).
31 - Nenhuma referência específica a uma passagem das Escrituras já cumprida é aludida sobre a traição de Judas - um escritor ficcional faria questão de identificar os textos do AT aos quais Jesus estava se referindo (17:12).
32 - A identificação do sogro de Caifás, Anás, sumo sacerdote entre os anos 6 e 15 d.C., está correta (18:13).
33 - A afirmação de que João conhecia o sumo sacerdote (18:15) carrega credibilidade histórica, uma vez que seria insensato da parte de um autor mentiroso expor-se dessa forma - ele poderia ser facilmente desacreditado pelas autoridades judaicas.
34 - A identificação de um parente de Malco é um detalhe que João jamais teria inventado - ele não possui nenhuma importância teológica e só poderia servir para minar a credibilidade do evangelista (18:26).
35 - Uma superfície similar ao Pavimento de Pedra foi identificada próxima da fortaleza Antônia (19:13) com marcas que podem indicar que os soldados entretinham-se ali com jogos - como no caso de tirar sortes sobre as roupas de Jesus, 19:24.
36 - A exclamação judaica "Não temos rei, senão César" (19:15) dificilmente teria sido inventada, considerando o ódio judaico pelos romanos, especialmente se João tivesse sido escrito depois do ano 70 d.C.
37 - A crucificação de Jesus (19:17-30) é corroborada por fontes não-cristãs como Josefo, Tácito, Luciano e o Talmude judaico.
38 - As vítimas de crucificação costumeiramente carregavam a própria travessa da cruz (19:17).
39 - Josefo confirma que a crucificação era uma técnica de execução que os romanos empregavam ("História da guerra judaica", 1:97; 2:305; 7:203). Um tornozelo de um homem crucificado, perfurado por um prego, foi encontrado em Jerusalém em 1968.
40 - Depois de a lança ter perfurado o lado de Jesus, jorrou aquilo que parecia ser sangue e água (19:34). Atualmente sabemos que uma pessoa crucificada pode ter uma concentração de fluídos aquosos na bolsa que envolver o coração, o pericárdio - é lógico que João não compreendia tal condição médica e não poderia ter registrado esse fenômeno se não o tivesse presenciado pessoalmente.
41 - É altamente improvável que Jose de Arimatéia (19:38), o membro do Sinédrio que ajudou a sepultar Jesus, tenha sido inventado.
42 - Josefo confirma que especiarias eram utilizadas em sepultamentos reais (19:39) - isso mostra que Nicodemos não esperava pela ressurreição de Jesus e também mostra que João não inseriu no texto conceitos cristãos posteriores.
43 - Maria Madalena, uma mulher que fora possuída por demônios (Lc 8:2), não seria inventada como a primeira testemunha do sepulcro vazio - tanto por ser mulher, quanto por sua condição anterior (20:1).
44 - O fato de Maria Madalena confundir Jesus com o jardineiro não parece ser fruto de uma invenção (20:15).
45 - O total de 153 peixes (21:11) é um dado teologicamente irrelevante, além de indicar o testemunho ocular.

"Em termos gerias, a evidência interna indica que o autor [do Evangelho de João] foi testemunha ocular dos eventos que descreve. Sobre isso, é interessante citar o veredito de Dorothy Sayers, que focalizou o assunto na perspectiva do artista criativo: 'Convém ter-se em mente que, dos quatro evangelhos, é João o único a apresentar-se como um relato direto de uma testemunha ocular. E para quem quer que esteja acostumado com o tratamento construtivo de documentos, a evidência interna confirma esse pressuposto.' (...) o falecido professor de história oriental antiga, na Universidade de Chicago, A. T. Olmstead, acredita que a história da ressurreição de Lázaro, que aparece no capítulo 11, exibe 'toda a minúcia circunstancial da testemunha ocular convicta', enquanto a narrativa do sepulcro vazio no capítulo 20 é 'narrada incontestavelmente por uma testemunha ocular - plena de vida e destituída de qualquer detalhe a que possa o cética usar para fazer uma objeção justificável'."
Fonte: Merece Confiança o Novo Testamento?, F. F. Bruce, Vida Nova, 2010, pg 64.

"E depois, João, o discípulo do Senhor, aquele que tinha recostado a cabeça ao peito dele, também publicou o seu Evangelho, quando morava em Éfeso, na Ásia", Papias, por volta de 125 d.C., citado por Irineu de Lyon. Fonte: Em Defesa de Cristo, Lee Strobel, entrevista com Craig Blomberg, Ph.D., Vida, 2011, pg 30.

Natanael Pedro Castoldi

Leia também:


Os Textos Bíblicos de João

Algumas das maiores polêmicas do Novo Testamento residem na real autoria dos livros tradicionalmente atribuídos ao apóstolo João - muitos consideram que o João que escreveu o Evangelho que carrega o seu nome foi o mesmo que escreveu as três epístolas (1, 2 e 3 João) e Apocalipse, enquanto outros atribuem uma parte da obra para o Apóstolo João e outra parte para um tal de João, Ancião de Éfeso. Diante disso, nos cabe refletir sobre a autoria das cinco obras citadas, analisando também as possíveis datas de redação para esse documentos.

1 - A redação do Evangelho de João:
Como já tratei desse tópico noutra postagem, não me parece necessário produzir um texto novo. Você pode ler a reflexão completa na seguinte postagem: Os Evangelhos - Autoria, Data e Confiabilidade. Mesmo assim, acho pertinente ressaltar alguns pontos do texto (as fontes estão no link acima):

Autoria:
A leitura do evangelho nos dá algumas evidências de quem foi o seu autor: ele era um judeu acostumado a pensar em aramaico, mesmo tendo escrito em grego - há muitas palavras hebraicas ou aramaicas inseridas nele, indicações da expectativa messiânica do povo judeu (1:19-28), conhecimento sobre a relação entre os judeus e os samaritanos (4:9) e a posição exclusivista do judaísmo (4:20), além de ele demonstrar familiaridade com as festividades judaicas; era um judeu palestino - há descrições muito precisas de Jerusalém e dos arredores (9:7; 11:18; 18:1), e familiaridade com as cidades da Galiléia (1:44; 2:1) e com o território de Samaria (4:5, 6 e 21);  o autor foi testemunha ocular dos eventos descritos - 1:14 e 19:35; ele observou detalhes, colorindo a narrativa como apenas uma testemunha muito observadora poderia fazer - Jesus sentando no parapeito do poço (4:6), o número e o tamanho das talhas nas bodas de Caná (2:6), o peso e o valor do perfume que Maria derrubou sobre os pés de Jesus (12:3-5) e os pormenores do julgamento de Cristo (caps 18-19). Certamente o autor de João andava com Jesus desde o começo do Seu ministério, uma vez que começa sua narrativa em momentos anteriores a todo o relato dos sinóticos; é muito provável que tenha pertencido ao grupo de discípulos que menciona; conforme o último capítulo, deve ser identificado como "o discípulo a quem Jesus amava", íntimo colaborador de Pedro e que estivera muito perto de Jesus na Última Ceia (13:23), no julgamento (18:15-16) e na cruz (19:26-27) - evidentemente um companheiro muito íntimo de Jesus. Como Tiago morreu muito cedo (At 12:2) e Pedro, Tomé e Filipe são sempre mencionados na terceira pessoa, nenhum deles poderia ser o autor desse livro - mesmo que o autor não tenha deixado seu nome explícito, sabia que seus primeiros leitores teriam certeza de quem ele era e João, filho de Zebedeu, é a melhor alternativa.

João era filho de um pescador chamado Zebedeu e de Salomé, provavelmente irmã de Maria, mãe de Jesus (Mc 1:19-20, 15:40; Mt 27:56; Jo 19:25). Ao crescer, João foi sócio de seu irmão, de André e de Pedro na pesca. Possivelmente foi discípulo de João Batista, nesse caso sendo o companheiro de André em João 1:40 e, portanto, acompanhou Jesus desde a sua primeira viagem pela Galiléia e, posteriormente, deixou da pesca para ir com ele em definitivo (Jo 2:2; Mt 4:21-22). São muitíssimos os eventos que João partilhou com Jesus: esteve com Ele em Jerusalém desde o início do ministério na Judéia; talvez a entrevista com Nicodemos tenha se dado em sua casa; posteriormente participou da Missão dos Doze (Mt 10:1-2); Jesus chamou João e André de "filhos do trovão" (Mc 3:17), indicando seu caráter explosivo, que fica explícito quando João repreende o homem que expulsava demônios, mas não seguia com eles (Lc 9:49) ou quando deseja que caia fogo do céu por sobre as aldeias samaritanas que não receberam Jesus (Lc 9:52-54) - tais comportamentos foram trabalhados por Cristo. Na Última Ceia, sentou em lugar de destaque (Jo 13:23); no julgamento, obteve acesso ao tribunal no sumo sacerdote, pois era seu conhecido (18:15-16); existe a possibilidade de que ele tenha sido representante em Jerusalém de sociedades de pesca de seu pai e, assim, se relacionado com todas as casas notáveis da cidade; é evidente que presenciou o julgamento e morte de Jesus e assumiu a responsabilidade por Sua mãe (19:26-27); João, ainda, andou com Pedro nos dias do funeral de Cristo e foi, junto com ele, um dos primeiros a ver o Túmulo vazio (20:8).

O epílogo desse evangelho sugere que o autor viveu por muito tempo depois do começo da Era Cristã, caso contrário não seria necessária qualquer explicação sobre a sua longa existência. Com base na sua biografia, vemos que João era veemente, que dedicou-se inteiramente a Cristo, tendo sua personalidade rude substituída pelo amor de Jesus, mas, mesmo assim, em toda a sua obra ainda exprime o ímpeto de sua natureza, quando, por exemplo, fala das censuras de Jesus aos incrédulos (8:44) ou chamando-lhes de "filhos do Diabo" (1 Jo 3:10).

Data:
Discutiu-se a data desse evangelho de 40 até 140 d.C., não podendo ser mais tardio que o Diatessaron, de Taciano, escrito em meados do Século II. O fragmento de Rylands, que preserva uma parte do evangelho de João (18:31-33, 37 e 38), deixa evidente que esse documento já estava em uso, no mínimo, na primeira metade do Século II - sabendo que tal papiro fora encontrado no Egito e data de 135 d.C., entendemos que algumas décadas devem ter sido necessárias entre a redação original, a sua cópia e a sua circulação até um ponto tão distante quanto o Egito, encaixando o evangelho como advindo de 89-90 d.C. Alguns, também, sugerem que tenha sido escrito antes da destruição do Templo em 70 d.C., isso com base no texto de João 5:2. As descobertas de Qumran confirmaram a autenticidade do contexto e do padrão de raciocínio judaicos observados no livro. A data mais clara para a redação de João fica entre 85 e 90 d.C.

O Apóstolo João e o Ancião de Éfeso:
Papias, citado por Eusébio, é a nossa fonte mais antiga sobre a autoria desse livro. Eusébio, ao interpretar Papias, alude a João, um dos discípulos do Senhor, e também a um ancião chamado João, discípulo de Jesus, concluindo que se tratavam de duas pessoas diferentes. Não podemos analisar o texto de Papias, apenas de Eusébio, mas é provável que ele tenha entendido errado as informações do antigo cristão: não há nenhuma razão para crer que um apóstolo não pudesse ser chamado de ancião - Papias parece ter se referido a João duas vezes, uma como presbítero e outra como discípulo, como fizera com outras figuras. A confusão se dá com a sugestão de que fora o "João ancião" o autor do evangelho, porém podemos entender que o "João ancião" é o mesmo que o "João discípulo" com base noutros testemunhos antigos, que corrigem qualquer falha de interpretação do texto de Papias: Teófilo de Antioquia (180 d.C.), Clemente de Alexandria (190 d.C.), Irineu (200 d.C.), Orígenes (220 d.C.), Hipólito (225 d.C.), Tertuliano (200 d.C.) e o fragmento muratoriano (170 d.C.) atribuem o evangelho ao discípulo João. Nem mesmo Porfírio e Juliano, o Apóstata, inimigos da fé, questionaram a autoria joanina - se fosse possível questionar a autoria de João, eles certamente o fariam, já que era oportuno abalar as estruturas de um documento que fala da divindade de Cristo de modo tão explícito.

2 - A redação das Epístolas de João:
Autoria e data:
Primeiramente, consideremos que as três Epístolas de João deixam evidente que foram escritas pelo mesmo autor, ainda que sejam todas elas obras anônimas, cujo escritor identifica-se, em 2 e 3 João, simplesmente como "O Ancião". Ocorre que a Igreja Primitiva constantemente atribuía essas obras ao exercício da pena do Apóstolo João - tal igreja nunca sugeriu nenhuma outra pessoa, uma vez que as evidências com as quais aqueles cristãos se deparavam, além da memória e da tradição, deixavam a questão bastante clara:
- O autor afirmou ser uma testemunha ocular de Jesus (1 João 1:1-3).

- 1 João exibe similaridades com o Evangelho de João, em termos de teologia, vocabulário e sintaxe.
- Os líderes da Igreja Primitiva, Papias, Policarpo, Irineu e Clemente de Alexandria, todos apontaram o Apóstolo João como o autor.

"O Ancião", identificado em 2 e 3 João, é tido pela tradição como sendo o próprio Apóstolo - além da tradição, existe uma similaridade óbvia em tema, vocabulário e linguagem entre as três cartas e o Evangelho - o estilo das duas cartas mais curtas é similar ao de 1 João e ao do Evangelho de João.

1 João:
- Algumas das similaridades entre 1 João e o Evangelho de João, estão em: 1 Jo 1:1 e Jo 1:1; 1 Jo 1:4 e Jo 16:24; 1 Jo 2:7 e Jo 13:34-35; 1 Jo 4:6 e Jo 8:47; 1 Jo 5:12 e Jo 3:36.

- O autor de 1 João aparenta ter idade avançada, em concordância com o Apóstolo João no período em que escreveu o Evangelho, conforme é demonstrado pela expressão "filhinhos", de 2:1 e 3:7.
- Sugere-se que tal carta tenha sido escrita por volta do final do Século I, até porque dá a entender que tem como um dos objetivos enfrentar uma espécie de "proto-gnosticismo", ou seja: situa-se num contexto próximo ao surgimento e expandir da heresia dos gnósticos. Vide 1 João 1:14:2. Se essa obra tivesse sido escrita depois, como uma refutação clara ao gnosticismo, certamente carregaria uma argumentação mais densa, conforme se observa nos tratados antignósticos no Século II (como o "Contra Heresias", de Irineu), coisa que não o faz. Com base nisso, concluímos que João escreveu num período no qual alguns cristãos e pagãos começaram a se posicionar contra a encarnação de Cristo, sem, contanto, chegarem a ameaçar a sobrevivência da Igreja, como ocorreu mais tarde.

"Ao determinar a data em que o texto foi escrito, devem-se considerar diversos fatores. Primeiro, o tom do livro e, especialmente, a postura do autor quanto aos leitores sugerem que se trata de um idoso falando a uma geração posterior. Segundo, Irineu assinala que João morou em Éfeso e escreveu Às igrejas da Ásia. As cartas de João Às igrejas da Ásia em Apocalipse (Ap 2 e 3) reforçam o comentário de Irineu. A conclusão natural é que 1 João se dirige aos mesmos cristãos. Terceiro, Paulo visitou Éfeso várias vezes entre 53 e 56 d.C., usando a cidade como centro de seus empreendimentos evangelísticos. Timóteo esteve em Éfeso com Paulo por volta de 63 d.C. e ainda estava lá quando Paulo lhe escreveu por volta de 67 d.C. Não há indicativos de que Timóteo e João tenham estado ao mesmo tempo em Éfeso; portanto, João deve ter visitado Éfeso depois que Timóteo partiu. Isso fixaria a data da redação de 1 João depois de 67 d.C., mas antes de 98 d.C. Parece razoável presumir uma data por volta de 90 d.C."

2 João:
- Algumas similaridades entre 2 João e 1 João e o Evangelho de João: Jo 14:23 e 1 Jo 5:3.
"(...) assim como em 1 João, os vestígios da igreja do primeiro século sinalizam que a missiva foi escrita pelo apóstolo [João]. Outro indício identificando o João desta carta como o apostolo é a semelhança dos termos e do teor entre 1 João e 2 João. O autor pode ter usado o título 'ancião' como um apelido carinhoso para si próprio, já que a sua autoridade como apóstolo não sofreria questionamentos em uma data tão avançada.
Esta epístola deve ter sido escrita pouco depois de 1 João, porque presume que os leitores entenderão o que 'anticristo' significa no versículo 7. É impossível determinar uma data exata, pois a informação é insuficiente tanto da própria carta como dos pais da Igreja. Seria possível uma data entre 80 d.C. e 100 d.C. Escritores da igreja do primeiro século afirmam que João foi morar em Éfeso depois da queda de Jerusalém, em 70 d.C., e, provavelmente, esta epístola foi redigida ali."

3 João:
- A carta, como um todo, é muito semelhante a 2 João.
"Assim como em 1 e 2 João, em geral se aceita que o autor dessa epístola seja o apóstolo João. As semelhanças entre as cartas e as tradições da igreja do primeiro século indicam fortemente que a autoria é de João. (...) há consenso de que o apóstolo teria redigido essa epístola.

Não há informações indicativas de data na epístola. As circunstâncias são bem diferentes das citadas nas duas primeiras cartas de João, tornando difícil dizer se foi escrita antes ou depois de 1 ou 2 João. Provavelmente, a carta foi remetida de Éfeso, onde a tradição da igreja do primeiro século diz que o apóstolo fixou ministério depois da queda de Jerusalém em 70 d.C."

3 - A redação de Apocalipse:
Autoria:
O autor tradicional de Apocalipse é o apóstolo João, que também escreveu o Evangelho e as três cartas que levam o seu nome. Existem boas razões para essa alegação:

- O autor refere-se a si mesmo como João (1:1, 4, 9; 22:8).
- O autor tinha relacionamentos pessoais com as sete igrejas da Ásia Menor (1:4, 11; caps 2-3), como era o caso do apóstolo.
- As circunstâncias na época da escrita (1:9) são as mesmas de João, o apóstolo.
- A grande quantidade de imagens do Antigo Testamento no livro sugere um autor judeu, como o apóstolo João.
- Mesmo que o autor não afirme categoricamente ser o "apóstolo João", é improvável que qualquer outro líder cristão do primeiro século tivesse a autoridade ou "fosse associado de maneira suficientemente íntima às igrejas da Ásia Menor para ter referido a si mesmo simplesmente como João".
- O Apocalipse tem muitos temas e ideias teológicas em comum com o Evangelho e as epístolas de João (somente Apocalipse e o Evangelho de João referem-se a Jesus como verbo de Deus e Cordeiro - Jo 1:1; Ap 19:13; Jo 1:29; Ap 5:6). "O tema do 'testemunho' também é particularmente proeminente nos cinco livros." Outras questões, como a ideia de Cristo como "o Pastor" (Jo 10:11 e Ap 7:17) e os contrastes entre "verdade e falsidade" e "luz e trevas" são comuns ao Evangelho de João e ao Apocalipse.
- É esperado que existam palavras diferenciadas em um livro que pertence a outro tipo de literatura, diferente dos outros textos de João. Apocalipse é o único representante neotestamentário de sua natureza literária.
- A Igreja Primitiva atribuiu, quase com unanimidade, esse livro ao Apóstolo João. Justino Mártir, Irineu, Tertuliano e Clemente de Alexandria são exemplos dos que apoiaram essa autoria.
- O autor de Apocalipse implicitamente se apresenta como uma autoridade. Em Apocalipse 10:10, ele come simbolicamente um rolo (como faz Ezequiel em Ez 3:1) e, em Apocalipse 22:18-19, ele atribui ao seu livro uma autoridade semelhante à de Deuteronômio 4:2.

Data:
Embora alguns sustentem que Apocalipse foi escrito em 68 e 69 d.C., a maioria supõe uma data próxima do final do Primeiro Século. Irineu afirma que João, o Apóstolo, escreveu esse livro no final do reinado de Domiciano (81-96 d.C.) - muitos creem que as perseguições aos cristãos promovidas por Domiciano estavam por trás de Apocalipse. Eusébio (265-340 d.C.) relata que João saiu de Patmos, onde ele afirma que escreveu Apocalipse (1:9), na época do imperador Nerva (96-98 d.C.).

"Confiáveis fontes históricas datando do segundo século d.C. situam o apóstolo João em Éfeso e ministrando por toda a província da Ásia por volta de 70-100 d.C. Aparentemente, as epístolas de 1, 2 e 3 João foram escritas pelo apóstolo aos cristãos naquela região por volta de 80-100 d.C. Durante a segunda parte desse período, o imperador Domiciano intensificou a perseguição aos cristãos. João estava exilado na ilha de Patmos por causa do seu testemunho como servo do Senhor. Ele foi libertado após 18 meses pelo imperador Nerva (96-98 d.C.), retornando para Éfeso, afim de reassumir sua liderança lá."

Os que sugerem a redação de Apocalipse no final dos anos 60 do Primeiro Século, estabelecem as seguintes argumentações: quando o texto fala das perseguições (2:9, 10 e 13) e da descrição da Besta, segundo alguns uma referência ao imperador Nero, há indicações de que o mesmo ainda estava vivo no período da redação; o texto de 11:1-2, parece sugerir que o Templo de Jerusalém ainda estava de pé e, uma vez que o Templo foi destruído em 70 d.C. e Nero morreu por volta de 68 d.C., é creditável que Apocalipse fora escrito no final dos anos 60 d.C.

Considerações sobre a longevidade de João:
A idade atingida por João depende da idade que ele tinha quando começou a seguir Jesus. Alguns estudiosos do Novo Testamento conseguem vê-lo como um adolescente, ou até mesmo uma criança de 12 anos - para mim, ele dificilmente teria menos de 14-15 anos, idade mais comum para o varão judeu estar estudando "aos pés de um rabino". A maioria dos estudiosos, porém, coloca João como um jovem-adulto, que, portanto, morreu por volta dos 101 anos. Mas existe bastante espaço para especulação. No mais, seria possível que ele tivesse passado de um século de vida? Ora, sendo que ele existiu e testemunhou sobre o contato com o Filho de Deus, podemos crer no cuidado do Criador com a vida do apóstolo. É interessante a resposta de Jesus ao questionamento de Pedro em João 21:20-23, apontando para o controle de Deus sobre a vida de João, que verdadeiramente não morreu martirizado, mesmo que tenham tentado matá-lo algumas vezes.  Mas existem algumas razões "menos bíblicas" para confiar na longevidade de João:
Sobre a estimativa de vida no Império Romano, Le Roux escreve:

"Quer se estabeleça uma média de idade a partir dos epitáfios ou que se calcule um resultado através da hipótese da expectativa de vida correspondente a um dado momento em que 50% + 1 de uma geração tenha cessado de viver, os cálculos propostos de 22 a trinta anos de duração de vida não são confiáveis. A 'tabela de sobrevivência' de Ulpiano nos autoriza a tentar uma outra abordagem. A expectativa de vida deve ser modificada gradativamente de acordo com a faixa etária atingida pelos indivíduos, o que significa que, por ocasião do nascimento, podia-se esperar que um homem não excedesse 20,4 anos e uma mulher 22,5, mas à medida que se iam sendo atingidas as dezenas, as perspectivas de modificavam sensivelmente. Aos trinta anos, um homem podia esperar ter ainda 23,9 anos pela frente e uma mulher 26,1. Quanto mais se avançada em idade, tanto mais as chances de envelhecer cresciam, 6% por faixa etária até atingir os sessenta anos. Deixando de lado a mortalidade infantil, sem dúvida extremamente elevada, nota-se que entre os quarenta e os cinquenta anos havia uma passagem difícil de franquear. Finalmente, apesar de uma reversão das tendências de sobrevivência entre homens e mulheres, desfavorável a estas no início, por causa das mortes no berço, voltando-se em seu favor ao longo das décadas da vida, esta inversão não chega a ser espetacular: entre os indivíduos que chegavam aos cinquenta anos, a expectativa de sobrevivência era a de que três mulheres chegassem aos noventa anos em comparação com cada homem."

Para o judeu havia, porém, um incentivo maior para a longevidade: o mandamento de "honrar teu pai e tua mãe como forma de prolongar a vida" exigia dos jovens o cuidado dos mais velhos, que acabavam vivendo mais - o homem não precisava ter filhos, pois a moral judaico-cristã exigia o acompanhamento de todos os idosos. Mesmo que João tenha sido exilado, enquanto líder em Éfeso certamente foi muito bem amparado pelos irmãos cristãos.
Fontes: Bíblia de Estudo Defesa da Fé, CPAD, 2010, introduções às epístolas de João e ao livro de Apocalipse; Bíblia de Estudo Arqueológica, Vida, 2013, introduções às epístolas de João e ao livro de Apocalipse e artigo da página 2060; O Novo Comentário Bíblico Novo Testamento, Earl D. Radmacher, Ronald B. Allen e H. Wayne House, Central Gospel, 2013, citações tiradas das introduções às epístolas de João e ao livro de Apocalipse; O Novo Testamento, Sua Origem e Análise, Merril C. Tenney, Shedd Publicações, 2008, introduções às epístolas de João; Talmidim, Ed René Kivitz,Mundo Cristão, 2012, contracapa e pg 7; Loucos por Jesus, Lúcio Barreto Jr., Central Gospel, 2012, pg 30; Império Romano, Patrick Le Roux, L&PMPOCKET Encyclopaedia, 763, 2009, pgs 70-71.

Natanael Pedro Castoldi
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Os críticos das Escrituras comumente alegam que Jesus nunca declarou ser o Messias de Israel, tendo sido deturpado posteriormente pela tradição. Será que isso se encaixa nas evidências? Verifiquemos!

1 - Posso confiar no texto do Novo Testamento?
Primeiramente, cabe refletir sobre a natureza literária dos Evangelhos e a quantidade e antiguidade dos manuscritos que temos do Novo Testamento: Mateus, Marcos e Lucas, os Evangelhos Sinóticos, apresentam seus relatos sem fazer uso de grandes acertos teológicos e profundas interpretações dos fatos, redigindo o relato, quer milagroso, quer cotidiano, de uma forma equilibrada, simples e sem os floreios e as agressivas intromissões comuns ao autor que deseja forçadamente persuadir seu leitor. A verdade é que temos redações até básicas demais mediante os assombros nelas descritos, lembrando aquelas cadernetas de campo que o cientista leva para registrar rapidamente aquilo que seus olhos perceberam, ou um diário, que não espera mais de um dia para ser escrito e que, portanto, dificilmente apresenta reflexões muito complexas - é claro que os Evangelhos em questão foram escritos com um pouco mais carinho e tempo, estou apenas ilustrando. Com isso não estou menosprezando os Sinóticos, pelo contrário: estou apontando para a sua legitimidade, para a honestidade e coerência quase que imparcial dos seus autores. É um fato que os Evangelhos tomaram como base, além da memória do autor, documentos escritos praticamente no momento dos ocorridos descritos.

A ausência de pesadas interpretações nos relatos originais e de floreios exagerados indica que o texto que temos foi escrito imediatamente após os eventos, sem ter havido tempo suficiente para a formulação da teologia cristã ou para o acrescentar de detalhes por demais distorcidos, típicos das tradições que, ao longo do tempo, são deturpadas - o apócrifo Evangelho de Pedro, muito posterior, por exemplo, já apresenta um espetáculo assombroso no dia da ressurreição de Cristo, com direito até a uma cruz falante (o documento que temos desse apócrifo pode datar dos séculos 4º ou 5º). O Evangelho de João, que foi escrito depois dos Sinóticos, por volta de 90 d.C., apresenta interpretações mais profundas de Cristo e Seu ministério, mas isso porque João escreveu depois e, portanto, refletiu mais sobre o que vira e ouvira - o que assegura a legitimidade de João está no completo acordo entre o seu conteúdo e o dos Sinóticos.
Fonte: O Jesus Fabricado, Craig Evans, Cultura Cristã, 2009, pg 7. Leia mais sobre isso nos seguintes artigos: Os Evangelhos - Autoria, Data e Confiabilidade; Uma Análise dos Apócrifos, Parte 2: Os Pseudepígrafos

Nós podemos ter certeza de que o texto neotestamentário, em sua completude, provém do Primeiro Século, isso com base no seu estilo literário, nos contextos geopolítico e histórico que se apresentam no texto, além de outras evidências internas do material, e nos achados arqueológicos infindáveis, com possíveis fragmentos do Novo Testamento que datam de até vinte anos depois da morte de Cristo e demais evidências que confirmam personagens históricos, eventos e localidades apresentadas pelas Escrituras, evidenciando o testemunho ocular. Só com os dizeres dos Pais da Igreja, líderes cristãos dos primeiros séculos, é possível reconstruir todo o Novo Testamento; só com base em 75 fragmentos de manuscritos antigos do Novo Testamento é possível reconstruir 40% do total do texto; há códices dos primeiros séculos da Era Cristã que apresentam o texto neotestamentário completo. Vislumbrando essas evidências, podemos concluir que os dizeres de Cristo no Novo Testamento, assim como os comentários dos autores dos livros e epístolas, são genuínos do período, não acréscimos posteriores. Leia mais nos seguintes artigos: A Preservação do Texto Bíblico; A Idade dos Manuscritos da Bíblia; Posso Confiar no Texto Bíblico Atual?

2 - Jesus afirmou ser o Messias?
a - O discurso de Cristo se encaixava na expectativa messiânica:
Jesus não podia declarar contínua e explicitamente a Sua divindade, principalmente no início do Seu ministério, pois isso prejudicaria a Sua missão de modo extremamente severo, uma vez que geraria incredulidade da parte do povo, que não poderia ouvir sobre divindade sem antes ver os sinais, e que levantaria uma forte perseguição da parte das autoridade judaicas e até mesmo romanas, pois o "homem-deus" do Império era César. Consciente disso, Cristo fez uso de recursos que foram especialmente claros para aqueles que estavam perto dEle e para os estudiosos das décadas posteriores - um desses recursos foi identificar-se com o discurso messiânico do Seu período.

A definição de "messianismo": a palavra hebraica "messias" significa "ungido". No Antigo Testamento essa palavra apontava para três ofícios: ao sacerdote ungido, ao rei ungido e ao profeta ungido. Normalmente, porém, o termo "ungido" é usado como referência ao "rei ungido" descendente de Davi, entendimento esse predominante nos dias de Jesus. Tal expectativa messiânica está bem expressada no manuscrito 4Q521 de Qumran, que fala das coisas que ocorreriam quando o Messias finalmente aparecesse:
"[Porque os céus] e a terra ouvirão seu Messias [e tudo que] neles está (Sl 146:6) não se desviará dos mandamentos dos santos. Fortalecei-vos, vós que buscais o Senhor em seu serviço. Não encontrareis, nisso, o Senhor, todos os que o esperam no coração? Pois o Senhor atende aos piedosos e chama os justos pelo nome. Sobre os humildes pousa o seu espírito (Is 11:2) e ele renova os fiéis em sua força. Pois ele honrará os piedosos sobre o trono de seu reino eterno, libertando os prisioneiros (Sl 146:7), abrindo os olhos dos cegos e levantando os decaídos (Sl 146:8). E para sempre eu me aterei aos que nele esperam e em sua fidelidade terão [...] o fruto do bem não tardará para ninguém, e o Senhor fará coisas gloriosas que não foram feitas, tal como ele mesmo disse. Pois curará os profundamente feridos, trará os mortos à vida (Is 26:19); ele enviará boas novas aos aflitos (Is 61:1), satisfará os pobres (Sl 132:15), dirigirá aos que se encontram desgarrados, e fará ricos os famintos (Sl 107:9)." 4Q521 frag. 2, col. 2, linhas 1-13.

Jesus, um Messias segundo a literatura da época:
O fragmento de Qumran, acima descrito, expressa os anseios messiânicos dos dias de Cristo, fomentados desde muito antes da Sua vinda. O engraçado é que Jesus, ao responder para João Batista sobre se Ele era mesmo o Messias (Mt 11:3), declara algo muito parecido com o que diz 4Q521:

"Ide e anunciai a João o que estais ouvindo e vendo: os cegos veem, os coxos andam (Is 35:5-6), os leprosos são purificados, os surdos ouvem (Is 35:5), os mortos são ressuscitados (Is 26:19) e aos pobres está sendo pregado o evangelho (Is 61:1). E bem-aventurado é aquele que não achar em mim motivo de tropeço." Mt 11:4-6. Para convencer João, Jesus apontou para aquilo que se esperava que o Messias fizesse!

Durante muito tempo os críticos afirmaram que o anúncio angelical para Maria, afirmando que seu filho seria "chamado filho do Altíssimo" e "Filho de Deus" (Lc 1:32 e 35), refletia a influência greco-romana sobre o cristianismo primitivo (uma vez que o imperador era chamado de "filho de Deus"), porém um manuscrito também achado em Qumran, 4Q246, 1º Século, denomina a figura salvadora esperada pelos judeus como sendo o "Filho de Deus" e o "Filho do Altíssimo". Outra correspondência interessante se dá entre Mc 1:1 e Sl 2:7, nos quais Deus diz ao Messias: "Tu és o meu Filho amado, em ti me comprazo" - o Sl 2:2 fala explicitamente sobre o "Messias do Senhor", mas os críticos chegaram a questionar se tal capítulo era entendido como messiânico nos dias de Jesus, coisa resolvida com o entendimento sugerido pelo manuscrito 1QSa, também de Qumran.

b - Jesus, o Messias segundo a literatura veterotestamentária:
Cristo denomina-se a si mesmo como o "Filho do Homem", o que evidencia o seu auto-entendimento como Messias, uma vez que nisso ele faz referência ao misterioso filho do homem de Daniel 7, uma figura que se aproxima de Deus e recebe um reino e autoridade. Jesus sabia que era o Messias de Israel!

A declaração de William Lane Craig sobre a expressão "Filho do Homem":
"É muito comum a ideia de a expressão 'Filho do Homem' ser usada em referência à humanidade de Jesus, assim como a expressão contrária, Filho de Deus, remeter à sua divindade. Acontece que a realidade é o oposto. O Filho do Homem era uma figura divina do livro de Daniel, no Antigo Testamento, que surgiria no final do mundo para julgar a humanidade e reinar para todo o sempre. Portanto, autodenominar-se Filho do Homem seria, na verdade, reivindicar para si a divindade."

Em entrevista para Lee Strobel, Ben Witherington III, Ph.D., aponta para a constituição do círculo mais próximo dos discípulos de Cristo: Jesus juntou exatamente 12 seguidores especiais, aludindo às 12 Tribos de Israel, que Deus reuniu no Antigo Testamento. Eram Deus e as 12 Tribos e, se os 12 discípulos representavam um Israel renovado, Jesus, como alguém além dos 12, considerava-se a si mesmo como o próprio Deus. Outra declaração espetacular de Jesus sobre Sua natureza divina encontra-se na Sua percepção sobre João Batista de que "Entre os nascidos de mulher não surgiu ninguém maior do que ele" - ocorre que Cristo estava consciente de que fazia muito mais do que João fez, principalmente em termos de milagres, e em momento algum discordou das declarações do próprio João Batista sobre ser ele, João, menor do que o Filho, indicando que Jesus tinha consciência de que Ele não era fruto da humanidade, mas gerado do próprio Deus.

Ben prossegue, apontando para o relacionamento de Cristo com as autoridades religiosas da época: devemos reparar, por exemplo, na radical declaração que Jesus faz sobre que "não é o que entra em uma pessoa que o corrompe, e sim o que sai de seu coração", colocando de lado grande parte do livro de Levítico e todas as meticulosas regras referentes à pureza. Que tipo de pessoa se julga imbuída de autoridade para pôr de lado as Escrituras judaicas divinamente inspiradas, substituindo-as pelo seu próprio ensino? Também é peculiar o tratamento que Jesus teve da parte das autoridades romanas: por qual motivo elas o crucificaram? Se Cristo não tivesse passado de um contador de parábolas, certamente não teria terminado na cruz, principalmente na Páscoa, quando nenhum judeu admite que outro judeu seja executado - havia um motivo para a inscrição acima da sua cabeça: "Este é o rei dos judeus". Ou Jesus declarou isso verbalmente, ou alguém o fez no seu lugar.

c - A interpretação de Cristo sobre Seus milagres:
É claro que os milagres que Jesus atestam para a Sua divindade, mas, por outro lado, os apóstolos também realizaram muitos milagres depois da morte e ressurreição de Cristo, isso no nome dEle. O que realmente é singular nas obras miraculosas do Messias está na interpretação que Ele mesmo deu para os Seus atos:
Em determinada passagem Jesus diz que realiza os milagres "pelo dedo de Deus" (Lc 11:20) e, com base nisso, aponta para a chegada do Reino de Deus. Ele não atribuiu quaisquer significados aos Seus milagres, mas colocou-se como aquele por meio de quem o Reino de Deus chegará.

d - O entendimento de Cristo sobre a Sua própria autoridade:
Noutros trechos dos Evangelhos, Jesus aparece dizendo coisas como "em verdade e em verdade vos digo", o que é o mesmo que: "Juro, desde já, que é verdade o que eu vou dizer" - isso é completamente revolucionário! Lembrando que o profeta do Antigo Testamento iniciava sua sentença com "Assim diz o Senhor:", enquanto Cristo, se colocando como Senhor, afirmava: "Eu vos digo"; "Eu, porém, vos digo". No judaísmo, era preciso o testemunho de duas pessoas, uma para comprovar o depoimento da outra, mas Jesus considerava-se a própria testemunha das Suas declarações - no lugar de basear Seu ensinamento na autoridade alheia, Ele o fazia com base na Sua própria autoridade. Fica claro que Jesus via como alguém dotado de autoridade superior e mais abrangente que os profetas veterotestamentários, incluindo o próprio Moisés.

e - O relacionamento de Jesus com o Pai:
O termo "Abba" era comumente utilizado pelo discípulo para chegar-se ao sue mestre, tendo uma conotação de intimidade, de um relacionamento entre pai e filho, mas Jesus o utiliza para falar com Deus, algo extraordinário e até considerado profano pelos judeus da época - era incomum pronunciar o nome de Deus e evitava-se a todo custo pronunciá-lo erradamente, levando os judeus a nunca referirem-se ao Criador por Seu nome, utilizando mais expressões como "O Santo, bendito seja" - "Abba" era um termo pessoal! O Filho colocava o próprio Deus Pai como o Seu mestre, Seu amigo íntimo, Seu "paizinho". Não há evidência alguma de que alguma pessoa, na época, com exceção de Jesus e de seus discípulos, orasse ao Pai dessa forma. Quando Jesus utiliza do "Abba" para falar com Deus, Ele se coloca na condição de quem está promovendo uma revolução espiritual, sendo o iniciador de uma espécie de relacionamento com Deus que antes inexistia.

Quando Pedro declarou que Cristo "é o Filho do Deus Vivo", Jesus não mudou de assunto, mas concordou e respondeu: "Feliz é você, Simão, filho de Jonas! Porque isto não lhe foi revelado por carne ou sangue, mas por meu Pai que está nos céus." Mt 16:15-17.

f - Jesus se via como sendo Deus:
William Lane Craig, no livro "Reasonable Faith", apresenta uma grande quantidade de provas que apontam para a existência de uma cristologia bastante desenvolvida já nos primeiros vinte anos após a crucificação de Cristo. o historiador da igreja, Jaroslav Pelikan, observou que o sermão cristão mais antigo, o mais antigo relato sobre um mártir cristão, a mais antiga narrativa pagã sobre a Igreja e a oração litúrgica mais antiga (1 Co 16:22) são todas passagens que se referem a Jesus como Senhor e Deus. Ele declara: "Sem dúvida, era essa a mensagem em que a igreja acreditava e que ensinava: que 'Deus' era um nome adequado para Jesus Cristo." Se Jesus nada tivesse falado sobre a Sua divindade, a única explicação para as declarações dos discípulos, feitas logo depois da Sua ressurreição, seria a de que todos havia enlouquecido, pois é praticamente impossível que uma cristologia tão desenvolvida sobre Jesus tivesse brotado do nada menos de 20 anos depois da Sua morte.

Quando Caifás questiona jesus sobre se Ele era "o Cristo, o Filho do Deus Bendito", Jesus respondeu: "Sou." E mais: "E vereis o Filho do Homem assentado à direita do Poderoso vindo com as nuvens do céu." Somente Deus pode ser adorado, mas aqui Cristo está afirmando ser aquele que julgaria o mundo e que receberia adoração, explicitando ser o próprio Criador. O Evangelho de João há 7 passagens nas quais Jesus se considera o próprio "Eu Sou", a forma como Deus se apresentou ao profeta Moisés em Êxodo 3:13-14 (6:35; 8:12; 10:7 e 9; 10:11 e 14; 11:25; 14:6; 15:1 e 5) - ora, nessas passagens Cristo está afirmando que é eterno e auto-existente! Tal declaração é tão forte que, no caso de Jo 8:56-59, os judeus imediatamente recolherem pedras para atirar nele. Talvez a única passagem que supere essas seja a de Jo 10:30, na qual Jesus declara: "Eu e o Pai somos um".

Declarações indiretas da divindade de Cristo:
- Em Jo 17:5, Jesus diz que Ele estava com o Pai antes que o mundo existisse, partilhando da glória de Deus. O AT, porém, afirma que existe apenas um Único Deus e que Deus não dá a Sua glória para ninguém (Dt 6:4; Is 45:5 e 42:8).
- Jesus disse, em Ap 1:17, "Eu Sou o Primeiro e o Último". O mesmo que Deus fala sobre si mesmo em Is 44:6.
- Em Jo 10:11, Jesus diz que Ele é "o Bom Pastor", conforme o que Deus diz em Sl 23:1 e Ez 34:12.
- Joel 3:12 afirma que Deus é quem julgará as nações. Jesus diz que Ele julgará todas as pessoas (Mt 25:31; Jo 5:27).
- O salmista diz que "o Senhor é a minha luz" (Sl 27:1) e Jesus diz que Ele é "a luz do mundo" (Jo 8:12).
- Jesus se declara o "doador da vida" (Jo 5:21), enquanto o AT afirma que Deus é o único que pode "doas a vida" (Dt 32:39; 1 Sm 2:6; Is 26:19; Dn 12:2; Jó 19:25).
- Jesus afirmou que Ele é o único caminho para o Pai (Jo 14:6).
- Cristo declara-se como o "noivo" (Mc 2:19; Mt 9:15; 25:1-13; Lc 5:34), mas Deus é identificado como o "noivo" no AT (Is 62:5; Os 2:16).

Declarações da divindade de Cristo da parte dos evangelistas e apóstolos:
João diz que Jesus é Deus (Jo 1:1 e 14); Paulo diz que Cristo "é Deus acima de todos" (Rm 9:5) e que "em Cristo habita corporalmente toda a plenitude da divindade" (Cl 2:9); Pedro diz que os crentes "de nosso Deus e Salvador Jesus Cristo a fé" (2 Pe 1:1); Mateus afirma a divindade de Cristo quando cita Isaías 7:14, na qual o filho da virgem deveria ser chamado de Emanuel, que significa "Deus conosco" (Mt 1:23); o autor de Hebreus fiz que "O Filho é o resplendor da glória de Deus e a expressão exata do seu ser, sustentando todas as coisas por sua palavra poderosa" (Hb 1:3), além de citar Salmos 45:3, afirmando que Deus diz o seguinte sobre o Filho: "O teu trono, ó Deus, subsiste para todo o sempre" (Hb 1:8). Até os demônios aparecem reconhecendo a divindade de Cristo (Mt 8:29; Lc 4:34 e 42)!

Jesus tomava atitudes exclusivas de Deus:
- Só Deus pode perdoar pecados. Cristo perdoou! Mc 2:5-11.
- Só Deus pode estabelecer mandamentos. Cristo estabeleceu um novo mandamento! Mt 28:18-19.
- Assim como Deus entregou os 10 Mandamentos para Moisés, Jesus entregou um Novo Mandamento aos discípulos. Jo 13:34.
- Só Deus pode receber orações. Cristo pediu aos discípulos que orassem em Seu nome! Jo 14:13 e 14 e 15:7.
- Só Deus pode ser adorado (Êx 20:1-4; Dt 5:6-9; At 14:15; Ap 22:8-9). Jesus aceitou adoração! Mt 8:2, 9:18, 14:33, 15:25, 20:20, 28:17; Mc 5:6; Jo 9:38, 20:28. Jesus não repreendeu os atos de adoração, mas elogiou-os - Jo 20:29 e Mt 16:17.
Fontes: O Jesus Fabricado, Craig Evans, Cultura Cristã, 2009, pgs 41-44; Em Defesa de Cristo, Lee Strobel, Vida, 2011, pgs 38 e 177-185; Não Tenho Fé Suficiente Para Ser Ateu, Norman Geisler e Frank Turek, Vida, 2012, pgs 349-354.

g - Como os não-cristãos da Antiguidade registraram Jesus?
Somente tomando dez referências sobre Cristo da Antiguidade, todas não-cristãs, compreendendo dizeres de Celso; Josefo; Plínio, o Jovem; Flegon; Talo; Suetônio; Luciano; Mara bar  Serapion; Tácito e do Talmude judaico, podemos montar o seguinte quadro sobre a vida de Cristo:

- Ele viveu durante o tempo de Tibério César.
- Ele viveu uma vida virtuosa.
- Realizou maravilhas.
- Teve um irmão chamado Tiago.
- Foi considerado o "Messias".
- Foi crucificado com autorização de Pôncio Pilatos.
- Sua crucificação ocorreu nas vésperas da Páscoa.
- Trevas e terremotos sucederam a morte.
- Sus discípulos acreditavam que ele ressuscitaria.
- Esses discípulos estavam dispostos a morrer pela sua crença.
- O cristianismo espalhou-se rapidamente, chegando até Roma.
- Os discípulos de Cristo negavam os deuses romanos e adoravam a Jesus como Deus.
Fonte: Não Tenho Fé Suficiente Para Ser Ateu, Norman Geisler e Frank Turek, Vida, 2012, pg 228.

h - Como os mais críticos estudiosos do Novo Testamento veem Cristo?
Gary Habermas foi o responsável pela realização da mais ampla investigação já feita sobre aquilo que os estudiosos acreditam a respeito da ressurreição de Jesus, reunindo mais 1,4 mil obras dos eruditos mais críticos que falam sobre a ressurreição, escritas entre 1975 e 2003, concluindo que quase todos eles concordam nos pontos que seguem:

- A morte de Jesus deu-se por meio de uma crucificação romana.
- Ele foi sepultado, provavelmente, num túmulo particular.
- Depois da Sua morte, os discípulos ficaram desolados.
- O túmulo de Jesus foi encontrado vazio pouco tempo depois do sepultamento.
- Os discípulos tiveram experiências que acreditaram ser aparições reais do Jesus ressurreto.
- Essas experiências transformaram profundamente as suas vidas, de modo que se dispuseram a morrer por Cristo.
- A proclamação da ressurreição começou logo de início, desde o nascimento da Igreja.
- O testemunho público e a pregação dos discípulos sobre a ressurreição de Jesus iniciaram-se na cidade de Jerusalém, precisamente onde Cristo fora sepultado e crucificado pouquíssimo tempo antes.
- A mensagem do evangelho centrava-se na pregação da morte e da ressurreição de Jesus.
- Tiago, irmão de Jesus, outrora cético, converteu-se ao reconhecer que viu Cristo ressurreto.
- Poucos anos mais tarde, Saulo de Tarso, ou Paulo, converteu-se ao declarar ter tido uma experiência fortíssima com o Filho ressurreto.
 Fonte: Não Tenho Fé Suficiente Para Ser Ateu, Norman Geisler e Frank Turek, Vida, 2012, pgs 306-307.

Natanael Pedro Castoldi
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