-> Apresentação e Índice
Atualmente muito tem sido falado sobre os "textos que a Igreja escondeu", os apócrifos do Novo Testamento, que trazem informações "perigosas", apresentando um Jesus que é incompatível com aquele que os Evangelhos canônicos evidenciam. A verdade é que de "escondidos" esses textos não têm nada, pois todos os conhecidos estão disponíveis para leitura e tradução, como "A Biblioteca de Nag Hammadi"(organizada por James M. Robinson), o "The Complete Gospels" (organizado por Robert J. Miller), ou o "The Other Gospels: Non-Canonical Gospel Texts" (organizado por Ron Cameron). Será que os apócrifos neotestamentários são confiáveis? A nossa fé precisa se abalar por causa deles? É o que veremos na sequência. Uma introdução melhor para os pseudepígrafos do Novo Testamento, você encontrará no artigo: "Uma Análise dos Apócrifos, Parte 2: Os Pseudepígrafos".
Fonte: Uma História Politicamente Incorreta da Bíblia, Robert J. Hutchinson, Agir, 2012, pg 235.
1 - A declaração de Eusébio de Cesaréia (263-340d.C.), historiador da Igreja, sobre os apócrifos:
"Entre os espúrios devem ser alistados ambos os livros chamados Atos de Paulo e aquele chamado Pastor e o Apocalipse de Pedro. Além desses, os livros chamados a Epístola de Barnabé e as chamadas Instituições dos Apóstolos. (...) há também alguns que alistam entre esses o Evangelho de Acordo com os Hebreus (...). Pode-se dizer que esses são todos a respeito dos quais há alguma controvérsia. Fomos, porém, obrigados a juntar aqui um catálogo também desses para distinguir os escritos verdadeiros, genuínos e bem autenticados daqueles outros não só não incorporados ao cânon, como igualmente discutíveis (...). Assim, teremos condições de conhecer esses livros e os citados pelos hereges sob o nome dos apóstolos (...) o caráter e o estilo em si [dos apócrifos] é muito diferente do dos apóstolos, e os sentimentos, e o propósito dessas coisas que são neles apresentadas, desviando-se ao máximo da ortodoxia sadia, provam evidentemente seres ficções de homens heréticos".
Fonte: História Eclesiástica, Eusébio de Cesaréia, CPAD, 2000, pgs 103-104 (Livro 3, capítulo XXV).
2 - Breves considerações sobre os apócrifos:
a - O Protoevangelho de Tiago:
O título foi sugerido no século XVI. O autor é desconhecido, tendo uma assinatura falsa para atribuir-lhe credibilidade.
b - O Evangelho de Maria Madalena:
Foram encontrados dois fragmentos, um copta e outro grego, que resultaram na redação desse apócrifo. Alguns o tom como um escrito gnóstico. O texto em copta é do século V e o grego é do século II.
c - O Evangelho de Pedro:
Até hoje se considera a atribuição a Pedro fictícia. O documento é datado por volta da segunda metade do século II, tendo sido originalmente redigido na Síria - alguns sugerem, porém, que a obra tenha sido escrita em Antioquia, na Diocese de Serapião. Esse documento é muito fantasioso, com direito até a uma cruz falante.
d - O Evangelho dos egípcios:
Clemente, Hippolito e Epifânio identificam tal obra como gnóstica. Tendo um título contestável, é impossível saber quem foram os seus usuários originais. O documento foi redigido por volta da segunda metade do século II.
e - O Evangelho de Filipe:
Evangelho gnóstico, apresentando um Jesus substancialmente diferente daquele que nos é evidenciado nos Evangelhos canônicos. Os textos preservados em copta datam do ano 300 d.C. ou 40 d.C., mas a datação dos originais, considerada contraditória, fica entre os anos 120 d.C. e 180 d.C.
f - O Evangelho de Bartolomeu:
Tal evangelho apresenta uma história bastante exótica: Bartolomeu e Jesus dialogando com Belial. Foi escrito entre o século II e o III.
g - O Evangelho segundo os hebreus:
É o mais antigo dos apócrifos, mas teve o seu texto extraviado. Apresenta uma literatura comumente empregada pelos ebionitas e nazarenos. Os nazarenos, provavelmente descendentes de judeus cristãos, migraram para a orla oriental do Jordão antes da queda de Jerusalém, em 70 d.C. Sobre os ebionitas há mais controvérsias: poderiam ser heresiarcas que tinham esse evangelho para negar a divindade de Cristo, ou um grupo que, embasado na Lei judaica, desprezava os escritos e os conceitos cristãos.
Fonte: Bíblia Apologética com Apócrifos, ICP, 2014, pgs 860-863.
h - O Evangelho Secreto de Marcos:
Na reunião anual da Sociedade de Literatura Bíblica, em Nova York, em 1960, Morton Smith revelou que, no ano de 1958, encontrou parte de uma suposta carta de Clemente de Alexandria (150-215 d.C.), no Monastério Mar Saba, na Judéia. O mais intrigante desse material eram as citações de uma versão secreta do Evangelho de Marcos. Só há um problema com tudo isso: vastos estudos dos documentos originais mostraram que tudo não passa de fraude, de uma invenção recente, cujo autor provavelmente seja o próprio Morton Smith.
Primeiro: no texto manuscrito há o que os especialistas em grafologia chamam de "tremor do forjador" - quando a letra não é escrita, mas desenhada na tentativa de imitar um estilo que não é o do autor. Segundo: comparações entre o documento original e outros manuscritos de Morton Smith evidenciaram sua autoria. Terceiro: temas distintos que aparecem no documento já estavam presentes em obras publicadas por Morton antes de 1958. Quarto: há mofo e reutilização de folhas outrora impressas - as marcas de mofo impossibilitam que o achado seja do seco deserto da Judeia. Há ainda outras evidências de fraude.
i - O Evangelho de Judas:
O códice foi encontrado no final da década de 1970 no Egito foi datado, após vastas análises, como advindo de algo entre 220-340 d.C. A maioria dos estudiosos o tem entre 300 e 320 d.C.
Fonte: O Jesus Fabricado, Craig Evans, Cultura Cristã, 2009, pgs 72-88 e 215-219. O livro de Craig Evans é altamente indicado para quem deseja se aprofundar na questão dos apócrifos neotestamentários, trazendo riquíssimas informações sobre muitos dos documentos que foram brevemente trabalhados nesse artigo.
Conclusão:
A intenção desse artigo é não ser exaustivo e trazer algum fôlego para os cristãos que têm se sentido ameaçados com os apelos midiáticos em favor dos apócrifos. Sei que não apresentei um estudo completo sobre os documentos, apegando-me mais nas conclusões, mas entendo que o leitor, instigado pelo material aqui apresentado, poderá procurar as fontes utilizadas e desbravar por si mesmo as minúcias desse polêmico assunto.
No mais, a principal consideração que deve ser destacada aqui está na idade dos documentos, obtida somente depois de exaustivas análises: sendo material comprovadamente tardio, posterior aos textos canônicos, não há motivo para termos nele alguma base de confiança sobre Cristo. O que temos são documentos redigidos muito tarde, quando já havia passado tempo suficiente para alguns ramos do cristianismo absorverem ares míticos e conceitos filosóficos pagãos, como o gnosticismo.
Natanael Pedro Castoldi
Leia também:
- Os Apócrifos: o Evangelho de Tomé
- Os Mais Antigos Testemunhos do Novo Testamento
Atualmente muito tem sido falado sobre os "textos que a Igreja escondeu", os apócrifos do Novo Testamento, que trazem informações "perigosas", apresentando um Jesus que é incompatível com aquele que os Evangelhos canônicos evidenciam. A verdade é que de "escondidos" esses textos não têm nada, pois todos os conhecidos estão disponíveis para leitura e tradução, como "A Biblioteca de Nag Hammadi"(organizada por James M. Robinson), o "The Complete Gospels" (organizado por Robert J. Miller), ou o "The Other Gospels: Non-Canonical Gospel Texts" (organizado por Ron Cameron). Será que os apócrifos neotestamentários são confiáveis? A nossa fé precisa se abalar por causa deles? É o que veremos na sequência. Uma introdução melhor para os pseudepígrafos do Novo Testamento, você encontrará no artigo: "Uma Análise dos Apócrifos, Parte 2: Os Pseudepígrafos".
Fonte: Uma História Politicamente Incorreta da Bíblia, Robert J. Hutchinson, Agir, 2012, pg 235.
1 - A declaração de Eusébio de Cesaréia (263-340d.C.), historiador da Igreja, sobre os apócrifos:
"Entre os espúrios devem ser alistados ambos os livros chamados Atos de Paulo e aquele chamado Pastor e o Apocalipse de Pedro. Além desses, os livros chamados a Epístola de Barnabé e as chamadas Instituições dos Apóstolos. (...) há também alguns que alistam entre esses o Evangelho de Acordo com os Hebreus (...). Pode-se dizer que esses são todos a respeito dos quais há alguma controvérsia. Fomos, porém, obrigados a juntar aqui um catálogo também desses para distinguir os escritos verdadeiros, genuínos e bem autenticados daqueles outros não só não incorporados ao cânon, como igualmente discutíveis (...). Assim, teremos condições de conhecer esses livros e os citados pelos hereges sob o nome dos apóstolos (...) o caráter e o estilo em si [dos apócrifos] é muito diferente do dos apóstolos, e os sentimentos, e o propósito dessas coisas que são neles apresentadas, desviando-se ao máximo da ortodoxia sadia, provam evidentemente seres ficções de homens heréticos".
Fonte: História Eclesiástica, Eusébio de Cesaréia, CPAD, 2000, pgs 103-104 (Livro 3, capítulo XXV).
2 - Breves considerações sobre os apócrifos:
a - O Protoevangelho de Tiago:
O título foi sugerido no século XVI. O autor é desconhecido, tendo uma assinatura falsa para atribuir-lhe credibilidade.
b - O Evangelho de Maria Madalena:
Foram encontrados dois fragmentos, um copta e outro grego, que resultaram na redação desse apócrifo. Alguns o tom como um escrito gnóstico. O texto em copta é do século V e o grego é do século II.
c - O Evangelho de Pedro:
Até hoje se considera a atribuição a Pedro fictícia. O documento é datado por volta da segunda metade do século II, tendo sido originalmente redigido na Síria - alguns sugerem, porém, que a obra tenha sido escrita em Antioquia, na Diocese de Serapião. Esse documento é muito fantasioso, com direito até a uma cruz falante.
d - O Evangelho dos egípcios:
Clemente, Hippolito e Epifânio identificam tal obra como gnóstica. Tendo um título contestável, é impossível saber quem foram os seus usuários originais. O documento foi redigido por volta da segunda metade do século II.
e - O Evangelho de Filipe:
Evangelho gnóstico, apresentando um Jesus substancialmente diferente daquele que nos é evidenciado nos Evangelhos canônicos. Os textos preservados em copta datam do ano 300 d.C. ou 40 d.C., mas a datação dos originais, considerada contraditória, fica entre os anos 120 d.C. e 180 d.C.
f - O Evangelho de Bartolomeu:
Tal evangelho apresenta uma história bastante exótica: Bartolomeu e Jesus dialogando com Belial. Foi escrito entre o século II e o III.
g - O Evangelho segundo os hebreus:
É o mais antigo dos apócrifos, mas teve o seu texto extraviado. Apresenta uma literatura comumente empregada pelos ebionitas e nazarenos. Os nazarenos, provavelmente descendentes de judeus cristãos, migraram para a orla oriental do Jordão antes da queda de Jerusalém, em 70 d.C. Sobre os ebionitas há mais controvérsias: poderiam ser heresiarcas que tinham esse evangelho para negar a divindade de Cristo, ou um grupo que, embasado na Lei judaica, desprezava os escritos e os conceitos cristãos.
Fonte: Bíblia Apologética com Apócrifos, ICP, 2014, pgs 860-863.
h - O Evangelho Secreto de Marcos:
Na reunião anual da Sociedade de Literatura Bíblica, em Nova York, em 1960, Morton Smith revelou que, no ano de 1958, encontrou parte de uma suposta carta de Clemente de Alexandria (150-215 d.C.), no Monastério Mar Saba, na Judéia. O mais intrigante desse material eram as citações de uma versão secreta do Evangelho de Marcos. Só há um problema com tudo isso: vastos estudos dos documentos originais mostraram que tudo não passa de fraude, de uma invenção recente, cujo autor provavelmente seja o próprio Morton Smith.
Primeiro: no texto manuscrito há o que os especialistas em grafologia chamam de "tremor do forjador" - quando a letra não é escrita, mas desenhada na tentativa de imitar um estilo que não é o do autor. Segundo: comparações entre o documento original e outros manuscritos de Morton Smith evidenciaram sua autoria. Terceiro: temas distintos que aparecem no documento já estavam presentes em obras publicadas por Morton antes de 1958. Quarto: há mofo e reutilização de folhas outrora impressas - as marcas de mofo impossibilitam que o achado seja do seco deserto da Judeia. Há ainda outras evidências de fraude.
i - O Evangelho de Judas:
O códice foi encontrado no final da década de 1970 no Egito foi datado, após vastas análises, como advindo de algo entre 220-340 d.C. A maioria dos estudiosos o tem entre 300 e 320 d.C.
Fonte: O Jesus Fabricado, Craig Evans, Cultura Cristã, 2009, pgs 72-88 e 215-219. O livro de Craig Evans é altamente indicado para quem deseja se aprofundar na questão dos apócrifos neotestamentários, trazendo riquíssimas informações sobre muitos dos documentos que foram brevemente trabalhados nesse artigo.
Conclusão:
A intenção desse artigo é não ser exaustivo e trazer algum fôlego para os cristãos que têm se sentido ameaçados com os apelos midiáticos em favor dos apócrifos. Sei que não apresentei um estudo completo sobre os documentos, apegando-me mais nas conclusões, mas entendo que o leitor, instigado pelo material aqui apresentado, poderá procurar as fontes utilizadas e desbravar por si mesmo as minúcias desse polêmico assunto.
No mais, a principal consideração que deve ser destacada aqui está na idade dos documentos, obtida somente depois de exaustivas análises: sendo material comprovadamente tardio, posterior aos textos canônicos, não há motivo para termos nele alguma base de confiança sobre Cristo. O que temos são documentos redigidos muito tarde, quando já havia passado tempo suficiente para alguns ramos do cristianismo absorverem ares míticos e conceitos filosóficos pagãos, como o gnosticismo.
Natanael Pedro Castoldi
Leia também:
- Os Apócrifos: o Evangelho de Tomé
- Os Mais Antigos Testemunhos do Novo Testamento
Obrigado pelo trabalho
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