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Ordens Monásticas: Anseio por Santidade

-> Apresentação e Índice
O desejo por santidade sempre permeou a vida de uma imensa quantidade de cristãos que, mesmo vendo parte da Igreja degringolando, decidiram manter-se nos princípios fundamentais da fé. O estudo sobre as ordens monásticas facilita o entendimento sobre o interesse dos cristãos, ao longo da História, de preservar a integridade da fé cristã. O breve estudo que segue estabelecerá de modo resumido a jornada das ordens em questão - tire as suas próprias conclusões.

           Segundo o livro Os Cristãos, de Tim Dowley, pg 59, pouco antes de Constantino ascender ao trono o número de cristãos aumentara drasticamente, de modo que os padrões de vida moral e espiritual decaíram, isso para se evitar exigências demasiadas ao grande número de novos fiéis. Diante da corrupção crescente entre os membros da igreja, alguns cristãos, aspirando um cristianismo mais puro, afastaram-se das cidades e congregações, desenvolvendo uma igreja paralela: enquanto os líderes da instituição lutavam pelo poder entre si e contra os soberanos seculares, esses fiéis piedosos passaram a viver em comunidades autossuficientes. Com o tempo, alguns desses cristãos começaram a levar uma vida eremítica, isolados em desertos, rochas ou ruínas, sozinhos ou em pequenos grupos, vivendo somente para a contemplação.
O mais famoso dos eremitas foi Antão (256-356 d.C.), cuja historicidade ainda é discutida por alguns, que tornou-se eremita ao basear-se em Mateus 19:21: nos primeiros 15 anos como eremita, habitou túmulos abandonados, mas achando isso pouco hostil, mudou-se para as ruínas de uma velha fortaleza nas profundezas do deserto. Como tornou-se popular, muitas pessoas foram procurar conhece-lo, de modo que se tornou mais um evangelista do que eremita, chegando a abandonar o forte e a fundar uma comunidade monástica em Colzim, perto Mar Vermelho. O estilo de vida eremita tornou-se comum nesses primeiros séculos de cristianismo e, além do número, os excessos aumentaram: alguns ficavam jejuando, orando, sem dormir ou de pé por vários dias seguidos. Fonte: Os Cristãos, Tim Dolwey, pgs 59-60.
O primeiro mosteiro cristão comunitário de que temos conhecimento foi fundado em aproximadamente 320 d.C. por Pacômio (287-346 d.C.), soldado de Constantino. Pacômio, enquanto esteve no Egito, converteu-se por seu contato com os eremitas do deserto e tornou-se um deles, mas, posteriormente, fundou uma comunidade de caráter ascético em Tabenisi, nas margens do Nilo, cultivando os próprios alimentos e estabelecendo uma rotina de orações e refeições em grupo, grupo tal concentrado na mesma propriedade, uns sob o mesmo teto, outros sozinhos, alojados em cabanas. O movimento monástico logo se alastrou e, ainda no século IV, todo o Egito já estava tomado de eremitas e mosteiros e, no final deste mesmo século, só em Constantinopla já haviam cerca de 300 mosteiros. Alguns mosteiros isolaram-se nas terra mais remotas do mundo que se conhecia: um no Monte Sinai, o de Santa Catarina, outros em cavernas na Capadócia, Turquia, e outros em montanhas, como a de Atos, na Grécia. O que foi falado aqui se refere, mais especificamente, aos mosteiros orientais.
O monasticismo ocidental iniciou-se com Martinho de Tours (397 d.C.) e, assim como Pacômio, fora soldado, eremita e, então, fundador de uma comunidade. Seu mosteiro, em Marmoutier ficou conhecido pela austeridade e pelo seu cunho evangelístico. Logo os mosteiros também estavam espalhados por toda a Europa Ocidental. Embora não tendo sido o pioneiro, Bento de Núrsia (480-547 d.C.) é considerado o “Pai do Monasticismo Ocidental”, sendo o redator da Regra, estabelecendo as atividades, o cronograma diário, o modo de trabalho... o fundamental para a vida monástica. Os monges que se formaram nos mosteiros baseados na Regra de Bento, grande maioria, são chamados até hoje de beneditinos. Com o tempo e a aquisição de importância, os mosteiros passaram a receber filhos da nobreza como membros, o que lhes foi destituído, aos poucos, parte de seu caráter de isolamento social.
Com o tempo, porém, o monasticismo tradicional passou a ser questionado. Em 817 d.C. Bento de Aniane (750-821 d.C.) estimulou uma abertura maior das ordens monásticas ao mundo exterior e, dessa forma, o exercício de maior influência e benefício social, mas, somente no século X é que essa revolução desejada tomou conta do Mundo Cristão, tendo como princípio a famosa abadia de Cluny, na Borgonha, centro da França que, com base no trabalho de vários abades, tornou-se um modelo para o mundo: pretendia-se que o local viesse a influenciar o rejuvenescimento do monasticismo mediante uma visão mais estrita da regra beneditina. No mosteiro de Cluny houve a iniciativa de, ao invés do isolamento, reintroduzir o monge na sociedade, de modo aos devotos mais radicais terem a oportunidade de mostrar ao público leigo um modo de vida estimulante e puro, servindo de exemplo positivo em oposição ao mais evidente e difamado clero tradicional, cercado de luxo. Cluny queria, ainda, eliminar a corrupção da igreja e introduzir a piedade cristã entre os cidadãos comuns.
Enquanto os cluniacenses incendiavam a França, na Inglaterra o arcebispo de Cantuária, Dunstan (909-88 d.C.), procurou reformar a igreja inglesa – seu contemporâneo, Oswald (992 d.C.), bispo de York, eliminou os abusos da Igreja e fundou mosteiros.
De todos os mosteiros da Baixa Idade Média, o mais rígido foi o da Grande Cartuxa, fundado em 1084 d.C. por Bruno de Colônia, ex-mestre-escola da catedral de Rheims. Nele os monges viviam de modo solitário em celas individuais – diz-se que a Ordem Cartuxa nunca foi reformada, pois nunca se corrompeu.
Outra ordem monástica, cujo objetivo era avançar ainda mais nas propostas de Cluny, surgiu no austero mosteiro de Císter, perto de Dijon, na Borgonha, em 1098, constituindo a ordem dos cistercienses. Os mosteiros dessa ordem eram construídos em locais isolados, para que seus monges não entrassem em contato com as cidades e suas vilanias – os locais eram escolhidos pela inacessibilidade. Os monges dessa ordem pregavam o silêncio e o rigor, dando uma nova ênfase ao árduo trabalho braçal. Em 1153 d.C., já havia 360 mosteiros dessa ordem na Europa e, no século XIII, 694. Os isolados monges tornaram-se especialistas na criação de ovelhas e prosperaram tanto nessa questão que começaram a vender os excedentes da produção de lã para as cidades, acumulando extensas riquezas materiais e, por fim, corrompendo-se.
Outra ordem que pode ser citada é a dos agostinianos, fundada no século XI, com base nos ensinamentos de Agostinho de Hipona: menos austera, fundou escolas, hospitais, asilos para leprosos e maternidades. Os Eremitas de Santo Agostinho, que iniciaram seus serviços em 1256 d.C., seguiram a mesma tendência dos outros monges mendicantes, sejam franciscanos, sejam carmelitas, sejam dominicanos. Eles percorriam as ruas lotadas de cidades que explodiam em desenvolvimento, como Florença e Gênova, construindo igrejas onde houvesse espaço.
A corrupção: cidadãos ricos doavam, comumente, grandes quantias de riquezas para os mosteiros, procurando o retorno monástico através do favor das orações. Os mosteiros mais ricos logo compraram grandes latifúndios, que servia para a produção em larga escala de diversos recursos de grande interesse comercial na Europa. Em muitas situações, ser monge se tornou mais uma profissão do que uma vocação.
Um dos maiores reformadores da Igreja até nossos dias pode ser considerado Francisco de Assis (1182-1226 d.C.), que sentiu o chamado para a vida monástica pela leitura de Mateus 4. Filho de um proeminente vendedor de tecidos, abriu mão da possibilidade de crescimento financeiro e, em desacordo com o pai, vestiu vestes pobres e passou a viver de modo itinerante, seguido por outros que pensavam de modo semelhante. Esse grupo passou a mendigar e a cuidar de todos os necessitados que encontravam. É famosa a história de quando Francisco beijou no rosto um excluído leproso e, sentindo uma alegria incontrolável, estimulou-se ao serviço piedoso. Nos primeiros anos de serviço, Francisco reformou, como um pedreiro, diversas igrejas e capelas abandonadas, algumas que, posteriormente, serviram de estabelecimentos para sua ordem crescente, a dos franciscanos e de uma outra, de sua amiga Clara (1193-1253 d.C.), de família rica que, influenciada por Francisco, aderiu à mendicância e fundou a Ordem das Clarissas Pobres – uma ordem feminina. Clara aceitou de modo especial a austeridade: jejuava três vezes por semana e dormia numa cama de galhos de videira, tendo como travesseiro uma pedra, o que lhe prejudicou a saúde - corrigida por Francisco, moderou na devoção penitente.
O monge mendicante tinha, em 1209, cerca de 12 discípulos, em dez anos, mais de 2 mil e, por fim, algumas décadas depois, aproximadamente 39 mil. Esse tipo específico de monge ficou conhecido como frade. Nos tempos de Francisco o comércio se aquecia de modo especial na Europa, levando o famoso mendicante a declarar que moedas valiam tanto quanto as pedras de um rio. Outro fato interessante sobre Francisco está em sua missão no Oriente Médio, para onde foi, em 1219 d.C., com o objetivo de evangelizar os muçulmanos pacificamente – antes dos cruzados chegarem. Francisco morreu em 3 de outubro de 1226: o líder pediu para ser enterrado diretamente na terra, despido, e, dessa forma, ser esquecido. Depois de sua morte, os franciscanos se espalharam pelo mundo: alguns que foram para a Hungria sujaram-se de estrume de vaca, para que os ladrões não os desejassem; outros, na Espanha, tiveram que dormir em um cemitério; uns fracassaram na Alemanha, pois não conheciam a língua local; outros foram martirizados no Marrocos. A Ordem Franciscana, com o tempo, tornou as universidades um de seus pontos fortes.
Pouco depois de Francisco uma nova ordem ganhou força, a dos dominicanos. Teve início na Bolonha, da parte de Domingos Gusmão (1170-1221 d.C.), de família nobre, nascido no norte da Espanha, perto de Burgos – ainda que a Península Ibérica estivesse dominada pelos muçulmanos. Um dos primeiros eventos importantes da vida de Gusmão foi a fome que assolou sua região quando tinha 21 anos, levando-o a vender seus caríssimos livros –na época um livro era muito caro- e distribuir o lucro entre os necessitados. Não tardou e o jovem entrou para um mosteiro agostiniano e, com a vocação para a pregação e evangelismo, foi autorizado –em 1216 d.C., mesmo que iniciada em 1214 d.C.- a fundar uma ordem monástica voltada a evangelização pacífica de alguns hereges da França. A ordem dominicana iniciou-se com 16 seguidores de Domingos, que se espalharam e angariaram mais seguidores, implantando muitas igrejas – um número tão grande que, numa viagem de inspeção nos locais da ordem, o líder do movimento viajou mais de 6 mil quilômetros a pé.
Com pobreza e simplicidade, a ordem conquistou respeito. Eram bons pregadores e ouvintes e o que pediam para sustento era apenas o suficiente para matar a fome –não queriam ser sustentados pelos pobres. Com o tempo, depois da morte de Domingos, a ordem interessou-se cada vez mais pelo conhecimento, rivalizando nas universidades com os franciscanos.
A contribuição dos monges: as igrejas das ordens monásticas eram vistas como benéficas para toda a sociedade – e muitos estabelecimentos tornaram-se reconhecidos centros de erudição e estudo. Alguns desses monges permaneceram anos copiando e ilustrando manuscritos. As ordens monásticas fundaram e administraram hospitais, escolas, asilos e abrigos para pobres e miseráveis – os domínios das ordens monásticas tinham reconhecimento por sua hospitalidade aberta a todos.

Fontes gerais: Os Cristãos, Tim Dowley, pgs 58-73; Uma Breve História do Cristianismo, Geoffrey Blainey, pgs 123-133.

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